Cancelamento de reserva
Uma proposta apresentada na Câmara dos Deputados prevê o cancelamento da propriedade de terras indígenas onde ocorrerem crimes ambientais — como venda ilegal de madeira ou tráfico de animais. A ideia, segundo o autor do projeto, o deputado Dr. Ubiali (Marco Aurélio Ubiali, do PSB-SP), é que os próprios índios se fiscalizem. “O objetivo maior não é puni-los, mas que eles sejam responsabilizados por atividades para as quais hoje se faz vista grossa”, afirma o parlamentar.
Pelo projeto de lei, qualquer condenação em última instância — depois que são apresentados todos os recursos — por um crime ambiental cometido em uma terra indígena faria com que essa reserva fosse cancelada, e todas as pessoas que morassem ali perdessem o direito de viver no local. “Se você tiver uma exploração ilegal em uma área de uma determinada tribo, é quase certo que isso é do conhecimento de todos, e se eles ignoram, são coniventes”, diz Ubiali.
Um mapa do Imazon mostra as terras indígenas (em laranja) e pontos da devastação ocorrida em setembro (em vermelho). Segundo o instituto, apenas 3% do desmatamento desse período ocorreu dentro de reservas indígenas, apesar delas ocuparem 21,6% da Amazônia.
Puorém, para a advogada Paula Souto Maior, do ISA-Instituto Socioambiental, o projeto fere a Constituição, pois estabelece uma punição coletiva aos indígenas. “A pena não pode passar para a família da pessoa que cometeu o ato ilegal”, afirma.
Segundo Ubiali, contudo, a punição à comunidade toda pode ser aplicada no caso dos índios. “É uma punição coletiva porque o crime é coletivo. Na tribo, você não tem um indivíduo cometendo um ilícito. Não há a figura do indivíduo dentro de uma tribo. A tribo tem um comportamento como um todo”, argumenta o deputado.
O líder indígena Aílton Krenak, conhecido por defender a Amazônia junto com Chico Mendes na década de 1980, discorda do deputado. Segundo ele, cada pessoa deve ser tratada separadamente e a própria legislação brasileira já prevê punição individual para índios que cometem crimes. “Como se pode dizer que crianças, velhos e outras pessoas da comunidade devam responder por quem cometeu um crime?”, questiona.
No conjunto dos fatos, apesar de haver problemas ambientais dentro de terras indígenas, esse é o tipo de reserva em que há menos desmatamento. Segundo os dados de devastação de setembro de 2009, publicados pela ONG Imazon-Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, houve 216 km² de desmatamento nesse mês e apenas 5 km² (3%) teriam ocorrido dentro de terras indígenas — apesar desses territórios ocuparem 21,6% da Amazônia brasileira. Os parques e reservas estaduais, por sua vez, sofreram 15 km² de desmatamento, e ocupam 20% da Amazônia.
“As terras indígenas têm se mostrado mais eficazes para a conservação da floresta do que as unidades de conservação — parques e reservas — que se beneficiam do aparato do Ibama, das secretarias de meio ambiente dos estados, e que têm gente trabalhando fazendo a manutenção e monitoramento dessas unidades”, aponta Krenak.
Questionado sobre a possibilidade de seu projeto ser aplicado também a propriedades privadas, Ubiali afirma que pretende apresentar uma emenda para que donos de terra também possam perder suas fazendas. De acordo com ele, a ideia será apresentada durante as discussões na Câmara para alterar o Código Florestal — lei que define, entre outras coisas, o quanto deve ser preservado dentro de cada terreno rural.
A proposta sobre terras indígenas tramita na Comissão de Meio Ambiente e, caso seja aprovada por essa e outras comissões, não precisará ir para votação no plenário para seguir ao Senado.
Desmatamentos, queimadas e notícias sobre toda a Amazônia Legal podem ser encontradas no mapa interativo Amazônia.vc, que também possibilita aos internautas protestar contra a destruição da floresta. O aplicativo Amazônia.vc foi desenvolvido em parceria com o INPE-Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, pelo programa Fantástico e Globo.com e traz mapa interativo com queimadas e desmatamento da região, permitindo a sua participação. Participe.
*por Iberê Thenório, em www.portaldomeioambiente.org.br (imagem: alguns Karitiana em pib.socioambiental.org)
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10 novembro 2009
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