06 abril 2010

MODA SUSTENTÁVEL

Têxteis com origem ética*



Sabe aquela camiseta de algodão natural guardada no seu armário, que traz uma mensagem amigável, insígnia de banda de rock ou opinião política?

Na verdade, essa camiseta pode ser a roupa mais ambientalmente tóxica que você possui. Só para começar, lembremo-nos de que, no Brasil, são produzidas cerca de 450 milhões de peças de camisetas por ano.

De acordo com um estudo do IISD-Instituto Internacional para o Desenvolvimento Sustentável, para confeccionar na China uma camiseta de 250 gramas utiliza-se, em média, 160 gramas de agrotóxicos.

Uma pesquisa do Departamento Agrícola dos Estados Unidos aponta ainda que cerca de um terço dos pesticidas e fertilizantes produzidos no mundo são pulverizados sobre o algodão.

A OMS-Organização Mundial de Saúde afirma que 25% dos inseticidas produzidos mundialmente são utilizados na plantação do algodão -- e quase metade deles são extremamente tóxicos.

O Aldicarbe (ou Temik 150) é, por exemplo, o segundo pesticida mais utilizado na produção de algodão mundial. Apenas uma gota dele, absorvida pela pele, é suficiente para matar um adulto.

Um levantamento do IISD, realizado em conjunto com o Centro para o Desenvolvimento Sustentável e o Meio Ambiente da Academia Chinesa das Ciências Sociais de Beijing, revela que o algodão está no topo da lista de produtos que precisam de controle ambiental.

Com isso, chegamos enfim a concluir que a água e os agrotóxicos utilizados no cultivo de algodão, os resíduos deixados nos rios e os restos despejados em aterros fazem com que o ciclo de vida da sua humilde camiseta de algodão tenha deixado um gigantesco rastro ecológico.

É por isso que celebridades, como o compositor/cantor Jason Mraz, apareceram na entrega dos Grammys usando ternos de plástico reciclado. Mas o movimento de "ecologização" da indústria da moda levanta uma pergunta ainda mais relevante: o que seria a moda sustentável?

Para encontrar respostas coerentes e práticas, é necessária a opinião de profissionais do lado menos atraente da indústria da moda, como pesquisadores ambientais e engenheiros de produção especializados na fabricação de tecidos, envolvidos em estudos de impacto ambiental.

No desenvolvimento de uma peça de roupa verdadeiramente orgânica, que não seja financeiramente exorbitante, designers, estilistas e consumidores de moda precisam trabalhar em conjunto com profissionais especializados em gestão de sustentabilidade.

No entanto, para ser qualificado como orgânico, o algodão ou lã devem passar por inspeções e processos sofisticados, de forma a que não sejam contaminados por produtos químicos e substâncias tóxicas.

Porém, a indústria têxtil mundial ainda encontra grande dificuldade para definir os padrões de qualidade mínimos necessários à criação de um produto realmente orgânico e sustentável.

No Brasil, diversos produtores da Paraíba já trabalham com a IFOAM-International Federation of Organic Agriculture Movements, visando atender à legislação referente a produtos orgânicos da Comunidade Européia e dos Estados Unidos.

Em 2007, cerca de 7,5 mil hectares nos Estados Unidos foram dedicados à safra de algodão orgânico. E programas como o “North American Organic Fiber Processing Standards” já estão se popularizando junto à indústria da moda.

De acordo com projeções do site DataMonitor, o mercado varejista de vestuário no bloco BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) deverá chegar a US$ 253,6 bilhões em 2013. Por ser o principal produtor e importador de algodão cru e o maior exportador de tecidos de algodão e vestuário acabado do mundo, a indústria têxtil chinesa tem grandes interesses neste novo cenário.

Sendo assim, a China já está se organizando para estabelecer os requisitos necessários à obtenção de escala na cadeia de produção de roupas orgânicas. Vale lembrar que sua cadeia produtiva já passou por problemas que precisam antes ser resolvidos.

O avanço do vasto deserto de Taklimakan, por exemplo, cujas dunas engoliram cidades inteiras, apavorando os moradores dos subúrbios de Beijing, tem sido associado à produção industrial do algodão em larga escala na província árida de Xinjiang ocidental.

Para além da indústria têxtil, o universo da moda também está se mobilizando. No mês passado, a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, em Genebra, Suíça, realizou a EcoChic: um desfile de moda sustentável, em que conhecidos designers criaram peças a partir de fibras naturais fabricadas de forma mais sustentável.

Em fevereiro de 2010, na Fashion Week de Londres, a exposição “Estethica” foi dedicada à moda ecologicamente sustentável. Em março de 2010, o Fashion Institute of Technology, em Nova York, uniu forças com a Universidade de Delaware e com a escola Parsons de design para montar uma exposição de moda sustentável, intitulada "Passion for Sustainable Fashion", na qual os estudantes criaram roupas com matérias de origem ética e matérias-primas ecologicamente neutras.

Outra alternativa seria o processo de reaproveitamento de produtos descartados, como o Upcycling, do qual o terno de Jason Mraz é um bom exemplar. O problema é descobrir como fazer o Upcycling em escala comercial.

Em tudo isso, o mais importante é a conscientização de que "sustentabilidade" não se trata de modismos passageiros e sim de um assunto que deve ser abordado de forma séria e coerente.

*Carolina Cabral Murphy é pesquisadora da Columbia University e fundadora da MicroEmpowering.Org, sediada em Nova York (EUA)

**Imagem do Taklimakan -- o "deserto de onde não se volta" --, postada na web por Lilian Hellmann: 350 mil km2 de areias escaldantes




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