Cartola, carioca do Catete, nasceu em 11 de outubro de 1908 — mesmo ano em que morreu outro gênio da arte nacional, Machado de Assis. Depois de viver por 3 anos em Laranjeiras, saiu da Zona Sul e foi morar na Mangueira aos 11 anos. O bairro classe-média e o morro deram régua e compasso para os versos e as canções do compositor.
Desde menino, o sambista participava de festas de rua. Aprendeu a tocar cavaquinho com o pai e se apresentava no rancho Arrepiados, em Laranjeiras, e nos desfiles do Dia de Reis. Até 15 anos, Cartola viveu com a família e freqüentou escolas de ensino clássicas. Com a morte da mãe, deixou as duas instituições e passou a ter lições de boemia.
O apelido Cartola de Angenor de Oliveira nasceu no canteiro de obra. Como pedreiro, o compositor usava sempre um chapéu para impedir que o cimento lhe sujasse a cabeça. Longe da rotina de pó e poeira, o pedreiro criava a base para uma das principais escolas de samba do País. Fundou em 1925, com seu amigo Carlos Cachaça, o Bloco dos Arengueiros. Era a semente da G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira, que surgiu em 28 de abril de 1928 da fusão desse e de outros blocos da região. O próprio Cartola escolheu o nome e as cores da agremiação.
A estréia da verde-e-rosa na avenida foi embalada pelo primeiro samba com a assinatura de Angenor de Oliveira. Era Chega de demanda, composto em 1928 (mas só gravado por Cartola em 1974, no LP História das escolas de samba: Mangueira). Em 1931, o nome do compositor chega a outros territórios: à época, era comum o artista do asfalto subir o morro para comprar música. Assim fez Mário Reis, que, com um punhado de dinheiro, adquiriu os direitos de gravação de Que infeliz sorte. Porém, a voz de Reis não se adaptou ao samba de Cartola. Quem acabou gravando foi Francisco Alves, que virou freguês das composições do mangueirense.
A relação, porém, mudou e Cartola passou a ceder apenas os direitos sobre a vendagem de discos, mantendo a autoria. Neste rol estão Não faz, amor (em parceria com Noel Rosa, em 1932), Qual foi o mal que eu te fiz? (1932) e Divina dama (1933). Neste período, as criações de Cartola ganharam outras vozes — como Tenho um novo amor (1932), gravado por Carmen Miranda e Na floresta, interpretado pelo parceiro da composição, Sílvio Caldas.
Os sambas da Estação primeira completavam a projeção além-Mangueira. Com o primeiro, em parceria com Carlos Cachaça, Pudesse meu ideal, a escola foi campeã do desfile promovido pelo jornal O mundo esportivo. Já Não quero mais (com Carlos Cachaça e Zé da Zilda, de 1936) deu outro prêmio à agremiação: a música, depois gravada por Araci de Almeida (1937), ganhou em 1973 nova interpretação e título de Paulinho da Viola, tornando-se Não quero mais amar a ninguém.
O início da década de 40 cristalizou o talento de Cartola entre a elite musical e também no seio da população mais simples. Ao lado de Donga, Pixinguinha e João da Baiana, o poeta participou, em 1940, de gravações com o maestro Leopoldo Stokowski. O repertório de MPB deu origem a dois álbuns de 4 discos, lançados nos EUA. No rádio, o compositor atuou como cantor, com músicas próprias e de outros autores populares. Naquele ano criou, com Paulo da Portela, o programa A voz do morro na Rádio Cruzeiro do Sul, no qual a dupla apresentava sambas inéditos de vários autores. Em 1941, formou o Conjunto Carioca, com Paulo da Portela e Heitor dos Prazeres, com o qual participou de programas da Rádio Cosmos, em São Paulo.
Os anos seguintes foram de ostracismo para o sambista. Cartola desapareceu do ambiente musical e muitos viveram a ilusão da morte do poeta. Alguns compuseram sambas em sua homenagem. Mas em 1948, a Mangueira o manteve vivo com o samba-enredo Vale do São Francisco (de Cartola e Carlos Cachaça) e conquistou o campeonato daquele ano.
Cartola só foi redescoberto pela mídia em 1956, quando o cronista Sérgio Porto o reencontrou. Eram tempos difíceis e o compositor vivia de bicos. De dia, lavando carros em uma garagem de Ipanema e, à noite, trabalhando como vigia de edifícios. Sérgio abriu caminho para o compositor cantar na Rádio Mayrinck Veiga. Logo depois, conseguiu-lhe, com ajuda de Jota Efegê, um emprego no jornal Diário carioca.
A década de 60 foi mais suave para o compositor. Já vivendo com Eusébia Silva do Nascimento — a Dona Zica —, eles fizeram uma pequena “revolução” gastronômica e musical na cidade: primeiro, o lar do casal tornou-se ponto de encontro de compositores. Depois, em 1964, a matriz do samba mudou de endereço — agora o point era o restaurante Zicartola, na Rua da Carioca. A casa fez história com a cozinha comandada por Zica, que com seus quitutes ajudava na inspiração de grandes sambistas do morro e de jovens compositores da geração pós bossa-nova.
Só na Terceira Idade, aos 66 anos, o mestre gravou seu primeiro LP — Cartola. O disco conquistou vários prêmios. Dois anos depois, lançou o segundo com o mesmo título do anterior. Naquele ano (1966), o cantor fez o seu primeiro show individual, acompanhado pelo conjunto Galo Preto. Um sucesso de público que ficou em cartaz no Teatro da Galeria, no Catete, por 4 meses.
O sambista ganhou destaque na TV em 1977: a Rede Globo exibiu um programa Brasil especial dedicado a Cartola. A audiência era crescente na tela e no palco. Em setembro do mesmo ano, participou do Projeto Pixinguinha, acompanhado por João Nogueira. O espetáculo começou no Rio e a ótima bilheteria carioca levou o show para São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. No mês seguinte, lançou o terceiro disco-solo: Cartola – Verde que te quero rosa.
Aos 70 anos, Cartola deixou a Mangueira e foi viver na tranqüila Jacarepaguá de 1978, quando estreou o segundo show individual. O quarto LP (Cartola – 70 anos) chegou ao mercado em 1979. Nesse período foi diagnosticado um câncer no compositor. Cartola morreu vítima da doença, em 30 de novembro de 1980.
Os lançamentos seguem após a morte do sambista: a Funarte editou e lançou, em 1983, o livro Cartola, os tempos idos, de Marília T. Barboza da Silva e Arthur Oliveira Filho, e, em 1984, o LP Cartola, entre amigos. A Editora Globo pôs nas bancas, em 1997, o CD e o fascículo Cartola, na coleção MPB Compositores (n.° 12). Entre composições próprias e de parceiras, Cartola deixou mais de 500 obras.
CARTOLA
É um filme simples e sofisticado como o próprio Angenor de Oliveira. Tem a ousadia de ser simples, cronológico, sofisticado e poético. Aproxima o espectador do seu principal objeto, o compositor e sambista que, sem ser letrado, fez canções e versos dignos de um imortal.
O filme revive o poeta Cartola, artista do subúrbio carioca cuja obra é uma verdadeira ponte cultural que liga um País dividido socialmente, emprestando sua biografia para os diretores Hilton Lacerda e Lírio Ferreira contarem, sob um ângulo original, parte da história da Mangueira, do Rio de Janeiro e da nossa música do século passado.
SINOPSE
A história de um dos compositores mais importantes da música brasileira. A história do samba a partir de um dos seus expoentes mais nobres. Utilizando linguagem fragmentada, Cartola traça um painel da formação cultural do Brasil, convidando a uma reflexão na construção da memória deste País. O retrato de um homem que se reconstruía com seu tempo.
Na construção deste discurso, os diretores refazem ambientes, captam depoimentos e costuram imagens com ficção, documentários e material jornalístico de arquivo. O testemunhal traz as pessoas que conviveram com Cartola e outras que vivem o cotidiano da comunidade da Mangueira — além de críticos, historiadores, cantores, músicos e compositores de seu tempo.
As imagens de arquivos resgatam longas-metragens, reportagens e entrevistas nas quais o sambista e o samba são os focos. Os filmes escolhidos são, na maioria, musicais das chanchadas das décadas de 40 e 50 e do cinema novo. Hilton Lacerda e Lírio Ferreira completam a assinatura com cenas que criam e recriam o espírito poético da narrativa.
A montagem e a seleção desse vasto material desenham o perfil do compositor e sua descoberta por uma MPB que evoluiu a partir do contato com os morros e seus sambistas. Produzido por Clélia Bessa e Paola Vieira (Raccord Produções), o filme começa com o enterro de Cartola e já o define como o narrador de sua própria vida.
O tom de ficção inicial atravessa todo o longa-metragem. Para ilustrar a compra e a venda de composições, por exemplo, Lacerda e Ferreira misturam cenas de ficção (Rio 40 graus, de Nelson Pereira dos Santos) que narram o drama de compositores de aluguel a imagens reais de Carlos Cachaça, principal parceiro de Cartola. Em off, os dois artistas relembram fatos do comércio de sambas na primeira metade do século XX.
A marca de Cartola imprime-se também nas cenas desenvolvidas para alinhavar com o material de pesquisa. Hilton e Lírio trazem para o filme a geografia musical do sambista e de suas composições. Estão lá a Mangueira, a Lapa, a Carioca e a Central, fotografadas por Aloysio Raolino. A dupla de criadores ainda coloca cerejas sobre o longa e refilma parte da história do personagem perdida no tempo.
A soma de todos esses elementos, editados e montados por Mair Tavares e pelos dois diretores, resulta numa unidade de linguagem que dá a Cartola características que o levam para bem além de um simples documentário. O filme surpreende, emociona e informa sobre o espírito de um dos principais criadores da Música Popular Brasileira.
SERVIÇO
Cartola — filme de Lírio Ferreira e Hilton Lacerda
Festival do Rio 2006 - Mostra Competitiva – Documentários
EQUIPE TÉCNICA
Direção e Roteiro: LÍRIO FERREIRA e HILTON LACERDA
Produção Executiva: CLÉLIA BESSA
Direção de Fotografia: ALOYSIO RAOLINO
Montagem: MAIR TAVARES
Direção de Arte: CLAUDIO DO AMARAL PEIXOTO
Figurino: RÔ NASCIMENTO
Som Direto: VALÉRIA FERRO (Ruído rosa)
Edição de Som: AURÉLIO DIAS e MARIA BYINGTON (Artesanato Digital)
Mixagem: ROBERTO LEITE e AURÉLIO DIAS
Programação Visual: TECNOPOP
Consultoria: ELTON MEDEIROS
Produção: CLÉLIA BESSA e HILTON KAUFFMANN
*Ator (Cartola criança): MARCOS PAULO SIMIÃO
Brasil - 2007 - 85 min - Cor
ENTREVISTA COM A PRODUTORA
A produtora Clélia Bessa vem trabalhando no projeto Cartola como quem cuida de uma espécie rara. Nos últimos 6 anos, o filme passou por mudanças que exigiram dedicação ímpar da sócia da Raccord Produções. Com a experiência de quem ajudou a tirar do papel os longas-metragens de Rosane Svartman Mais uma vez amor e Como ser solteiro e o programa musical Claro q é rock, exibido no canal Multishow, Clélia captou recursos e reuniu profissionais capazes de dar vida a um filme ousado e em constante evolução.
A quanto orçou o filme Cartola?
Clélia Bessa: O filme custou em torno de R$ 1,2 milhão. A captação de recursos não foi fácil. Conforme o projeto avançava, o filme ganhava nova dimensão e os custos aumentavam. Cartola é um filme vivo. Fechamos a poucos meses do lançamento.
Qual a maior dificuldade na produção?
Clélia: O filme tem cerca de 85 minutos e 65% são arquivos. A negociação e a pesquisa foram difíceis e complexas. As fontes de arquivo eram as mais diversas, de emissora de TV que faliu a pessoas físicas. Ainda recuperamos uma série de arquivos de imagem do compositor. O som também teve uma complexidade técnica, precisou passar por um processo de reestruturação para ter uniformidade.
Como foi o processo de pesquisa de imagens?
Clélia: Investimos muito na pesquisa de imagem. O acervo iconográfico de Cartola não é vasto. Não foi encontrada, por exemplo, uma imagem em movimento do Zicartola.
E os herdeiros do compositor? Como foi essa negociação?
Clélia: Negociamos com os herdeiros oficiais e reconhecidos. Ele não teve filhos naturais.
Na sua opinião, qual a justificativa para se desenvolver um projeto como o de Cartola?
Clélia: O brasileiro gosta de ouvir e ver a história do País retratada nas telas. Veja o exemplo do documentário Vinícius, que foi um sucesso de público. Cartola, como Vinícius, é fundamental na história da música desse País.
Há planos de lançar CD ou outro produto vinculado?
Clélia: Não, ainda não pensamos nesse ponto, não há nada programado.
Quem patrocina o projeto?
Clélia: Os patrocinadores são BR Petrobras, Telemar, Eletrobrás, Infraero. O filme também tem recursos do BNDES e da Itaú Cultural, esse no desenvolvimento do roteiro. A produção é da Raccord e co-produção da Globo Filmes, com distribuição da Riofilmes.
Clélia: Os patrocinadores são BR Petrobras, Telemar, Eletrobrás, Infraero. O filme também tem recursos do BNDES e da Itaú Cultural, esse no desenvolvimento do roteiro. A produção é da Raccord e co-produção da Globo Filmes, com distribuição da Riofilmes.
VEJA
Segue uma versão em avant-trailer do filme Cartola , música para os olhos, que estréia dia 06 de abril, somente nos cinemas. Siga o link e aprecie boa música e belas imagens
http://www.youtube.com/watch?v=xlMRgr6vxLg
SAIBA MAIS
http://www.raccord.com.br
cleliabessa@raccord.com.br
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cleliabessa@raccord.com.br
Skype ID: cleliaelisa
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