10 janeiro 2008

CARTÃO-POSTAL

O "plus" da cena carioca


Um dos mais famosos veículos de todos os tempos ganha livro em comemoração aos seus 95 anos. Sob o selo de Andrea Jakobsson Estúdio, sinônimo de capricho gráfico e apurado contexto editorial, Bondinho do Pão de Açúcar - 95 anos da Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar conta uma história intimamente ligada à trajetória da cidade do Rio de Janeiro, narrada através de textos assinados por personas como Nelson Motta, Léo Jaime, Pedro da Cunha e Menezes, Telma Lasmar e Pedro Carauta, entre outras personalidades e pesquisadores íntimos do Pão de Açúcar e de sua maior maravilha.
O sonho do visionário engenheiro Augusto Ferreira Ramos de construir um teleférico ligando os morros que formavam uma das paisangens mais lindas e exaltadas (em prosa, verso, pinturas, fotografias etc.) do País tornou-se realidade em 27 de outubro de 1912, ao ser inaugurado o primeiro trecho do teleférico ligando a Praia Vermelha ao Morro da Urca. Logo depois, em 18 de janeiro de 1913, começava a funcionar o segundo trecho entre o Morro da Urca e o Pão de Açúcar. Neste dia, 449 pessoas tiveram o privilégio de embarcar no bondinho, chegar ao topo do símbolo-maior da Cidade Maravilhosa e deslumbrar-se com a vista estonteante que até hoje inspira e emociona pessoas do mundo inteiro.

Desde então, o bondinho transportou milhões de pessoas e participou de momentos históricos, shows inesquecíveis, namoros nos jardins, festas animadíssimas, bailes de Carnaval e Réveillon, e recebeu turistas e cariocas que conheceram a vista do Pão de Açúcar, e sem risco ou esforço fizeram fotos como Marc Ferrez — o primeiro a retratar a paisagem vista do topo do Pão de Açúcar em 1890, quando escalou o morro com mais de 100 kg de equipamento.

O livro apresenta textos de apaixonados pelo Pão de Açúcar que conviveram intimamente com diversos aspectos deste patrimônio tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - Iphan, em 1973. Eles apresentam detalhes desta trajetória histórica, por Pedro da Cunha e Menezes e Telma Lasmar, geologia, por Diógenes de Almeida Campos, fauna e flora, por Jorge Pedro Pereira Carauta, montanhismo, por Waldecy Mathias Lucena, e dos shows que marcaram toda uma geração, por Nelson Motta, criador do lendário Noites Cariocas, e Léo Jaime, um dos muitos artistas que se apresentaram no palco da Concha Verde para uma platéia que chegava a 3 mil jovens nas inesquecíveis noites de sexta e sábado.

Com o objetivo permanente de ampliar horizontes, The Bank of New York Mellon patrocina o livro sobre os 95 anos do bondinho. Com escritórios em 37 países e atendendo acima de 100 mercados, o banco administra mais de US$ 20 trilhões em recursos financeiros em todo o mundo. A iniciativa reforça o compromisso da instituição com o Brasil e com o Rio de Janeiro.

Trazendo 150 imagens, a edição traça um panorama que completa 95 anos, retratando desde o surgimento do nome "Pão de Açúcar", dado à época do descobrimento, quando os navegadores mapearam o litoral identificando os portos seguros, até as mudanças na paisagem do entorno, bem como a evolução dos bondinhos que permitiram o acesso ao seu topo. Os textos — curtos e concisos — prendem a leitura e a seleção de imagens é segura fonte de deleite para todos os que apreciam a deslumbrante beleza da cidade do Rio de Janeiro.


SERVIÇO
Bondinho do Pão de Açúcar - 95 anos da Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar Sugar Loaf Cable Car - 95 years of the Sugar Loaf Aerial Pathway Company - Edição bilíngüe (Português/Inglês), 200 págs, R$ 95

Formato: 23 x 28 >>Idéia: Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar >> Realização: Andrea Jakobsson Estúdio Editorial - Textos: Diógenes de Almeida Campos (diretor do Museu de Ciências da Terra, Departamento Nacional da Produção Mineral e Membro da Academia Brasileira de Ciências), Jorge Pedro Pereira Carauta (Pesquisador-associado no Departamento de Botânica do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ), Léo Jaime (músico, ator e escritor), Maria Ercília Leite de Castro (Diretora Geral da CCAPA), Nelson Motta (jornalista, compositor, escritor, roteirista e produtor musical), Pedro da Cunha e Menezes (escritor e diplomata, profundo conhecedor da história da cidade do Rio de Janeiro e representante permanente adjunto do Brasil junto ao Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), Telma Lasmar (museóloga responsável pelo projeto do Museu Aberto do Bondinho Pão de Açúcar e professora da UFF e do UNIPLI), Waldecy Mathias Lucena (escalador, vice-presidente da Federação de Montanhismo do Estado do Rio de Janeiro) >> Fotos: Marco Terranova, Ricardo Azoury e outros
Projeto Gráfico: Jair de Souza >> Lançamento: 17 de janeiro de 2008 no Morro da Urca


SAIBA MAIS
Andrea Jakobsson Estúdio Editorial Ltda.
R. Xavier da Silveira, 45 - sala 906 - Copacabana, Rio de Janeiro/RJ
Tel.: (21) 2267-6763

08 janeiro 2008

O ÍNCUBO

Aquecimento local


Ele virá como num sonho mas será real. Porque habita a realidade mais profunda — e inadmissível, não esqueça — dos seus desejos femininos. Chegará devagar e sem alarde. E deixará os sapatos à entrada para poder pisar delicadamente o seu chão e sentir desde o início todos os detalhes de sua presença. Ele, o meticuloso.

Haverá uma roupa no sofá da sala, você anda meio desleixada?... Quem será o moço no porta-retrato, seu namorado? Que diria se acaso soubesse que ele esteve em seu apartamento a essa hora da noite? A porta de seu quarto estará trancada, evidente, mas ele já sabe que você anseia por essa visita. E é exatamente por isso que poderá vir e entrar. Se este encontro não existisse antes em seu pensamento, minha querida, ele não passaria jamais por esta porta, aberta ou fechada.

Ele entrará em seu quarto enquanto acostuma os olhos à penumbra do ambiente, os olhos que a encontrarão dormindo na cama. Já haverá algum tempo que não se vêem, ele estará curioso em saber como você está. Você dormirá tranquila, os lábios roçando o travesseiro e os cabelos escorrendo pelas curvas do seu rosto suave. Então ele se permitirá profanar a harmonia do quadro e afastará para o lado uma mecha de cabelo que insiste em querer seus lábios. Ele, o profano.

Não, de forma alguma ele se sentirá culpado por invadir assim sua intimidade mais secreta, logo você, tão cheia de recatos. Porque foi você quem quis assim embora jamais o revele, nem a si mesma. É essa a lógica dele: você tem que chamá-lo, para que ele possa vir. Estará, portanto, somente realizando um velho desejo seu — você é que sempre foi boba para admitir os próprios pensamentos. Ele, aliás, gostaria imensamente de estar presente quando, pela manhã, você sonolenta a lavar o rosto, viesse a primeira lembrança do sonho que teve, tão estranho, tão louco... Mas tão real, não?, tão real...

Ah, ele adoraria vê-la, você estancando subitamente, em pé ao espelho, os olhos na expressão de quem lembra, o gesto suspenso na vã tentativa de congelar o resto de lembrança que vai morrendo, morrendo... E a cara de incredulidade e espanto. Mas não, ele não poderá estar presente. Seus poderes não resistem longe dos sonhos.

Ele puxará a ponta do lençol, descobrindo seu ombro magro. Mais um pouco e surgirão aos seus olhos agradecidos os seus seios, descansando serenos e alheios no ritmo calmo de sua respiração. Ele não resistirá e deixará escapar um sorriso... Nesse momento já não poderá evitar de se deter um pouco e comparar a imagem que tem à mulher que conhece, tão pudica. Se você pudesse despertar agora, certamente teria um de seus repentes de indignação e bradaria que ele está violando sua intimidade e que não tem o direito. Mas nesse sonho, minha querida, não há lugar para violências. E, além do mais, não foi você quem o chamou? E quem melhor que ele, o que capta o que se esconde, para entender a beleza tímida dos seus seios?

Então, de repente, para total surpresa dele... você se moverá! E virará o corpo para o lado, privando dos seus seios o olhar dele. Ele confessará, do alto de suas vivências no assunto, que, tsc-tsc, por essa não esperava. E não esperava mesmo. Então sussurrará ao seu ouvido, sorrindo uma revolta bem-humorada, que certos pudores não têm jeito, não adormecem nunca.

Em sinal de protesto ele puxará de uma vez o lençol que cobria seu corpo... E terá outra surpresa o nosso amigo. Duas, para ser exato. Quem, em algum tempo, poderia imaginar, inclusive ele, que aquele autêntico recato ambulante dormisse nua, inteiramente nua, despojadamente nua? E, mais curioso ainda, que fosse tão surpreendentemente desejável sem vestes?! Ninguém certamente, você sempre fez questão de se ocultar demais. E ele muito menos, ele que há algum tempo flagra a ânsia dessa aventura por trás das couraças de sua defesa.

Retirado o lençol, o profano se afastará da cama e se posicionará melhor para observar, pintor orgulhoso do novo quadro. Você nua na cama. Nua e sem defesa. Entregue aos olhos de um homem como jamais imaginou que pudesse. A pele brilhando na penumbra. O corpo inteiramente nu, convidativamente disposto sobre a cama, finalmente autorizado, nihil obstat. Ah, ele se deliciará enormemente ao vê-la aprisionada em sua própria nudez. Deliciosamente prisioneira. Insuspeitavelmente bela.

E ele percorrerá com os olhos comovidos as paisagens de seu corpo, montes e planícies, savanas e cavernas. Gozará sinceramente enternecido todas as minúcias de sua pele e procurará novos ângulos para sua beleza inconsciente — e finalmente despudorada. Um fino e cruel ladrão de intimidades, desumano e desrespeitador. "Ora, convenhamos...", ele dirá, "um pouco de perversidade não faz mal a mulher nenhuma!" Principalmente a você, que sequer admite durante o dia o que se permite em sonhos...

Então ele perceberá, desconfiado, a sua respiração mais intensa... o ritmo mais acelerado... Aproximará o rosto do seu, já antevendo a nova surpresa, e por fim constatará sua excitação. "Ora, ora...", ele exclamará sorrindo, e, enquanto se despe ao lado da cama, observará seus movimentos angustiados e impacientes, como se buscasse alguém ausente.

Ele comparecerá a esse encontro porque você o quer, vamos deixar isso bem claro, mas também porque anda curioso em saber o que existe por trás de toda essa sua aparente frieza e indiferença. Aparente sim, ele sabe disso. Mesmo nas mulheres, bichos ardilosos que sempre foram, o olhar nem sempre acompanha a velocidade da mentira — ou da habilidade, como queira. E foi o olhar, minha querida, foi exatamente esse pequeno detalhe que naquele dia a denunciou, a você e suas tão bem-cuidadas aparências. Foi apenas um rápido encontro de olhares, você talvez nem se lembre. Foi somente um desejo que, por um segundo, escapou sorrateiro de sua vontade e que, ao perceber o olhar dele, ato contínuo, voltou a ser frieza e desdém. Ah, mas já era tarde. Ele agora sabia de tudo.

Jogada a roupa a um canto, ele se deitará ao seu lado na cama, já chega de perversidade. Sentirá então o calor receptivo e o aroma delicado de sua pele. Você jogará ao chão velhos escrúpulos que por lá ficarão enquanto ele não se for e decerto que se espantarão ante toda a sua disposição revelada. Seus olhos estarão sempre fechados, mas verão tudo em seu sonho. Só não verão os olhos dele, o que fará mais difusa ainda sua recordação. Se pudesse, ele confessaria que por vezes lhe falta a cumplicidade do olhar, em algumas mulheres bem mais que em outras. Mas as regras são essas, o que se pode fazer?

Enquanto sua boca o procura e seus braços exigem com avidez o corpo dele, ele sorrirá dessa sua insuspeitada ardência. E finalmente fechará os olhos, deslizando de vez para dentro do seu sonho, envolto pela velha sensação de vertigem, dor e alívio que essa queda lhe provoca. E só retornará quando novamente abri-los.

No outro dia você se lembrará de quase tudo, mas sua lembrança será como névoa — que, aos poucos, e sem que você possa evitar, irá se dissipando, terminando por se transformar naquela sensação de já ter vivido algo assim em algum dia, algum lugar... "Mas como, se tudo foi apenas um sonho?", você se perguntará, sempre surpresa com a qualidade das lembranças.

Lembranças que a farão sorrir pelos cantos do dia, subitamente envergonhada. "O que foi?" — a amiga indagará, desconfiada, e você disfarçará, procurando qualquer coisa para se ocupar e fugir do flagrante. Mas nem sempre conseguirá conter o sorriso que, fora do seu controle, denunciará a si mesma uma descarada satisfação.

Você pensará nele, sim, pensará. E por pouco não se renderá ao desejo, várias e vacilantes vezes ao lado do telefone. Sussurrará na rua, sem querer, o nome do maldito. Mas ao mesmo tempo evitará de todas as formas encontrá-lo, pois se sentirá nua nesse encontro. Perceberá um vento gelado a roçar-lhe os pêlos e trazer arrepios toda vez que se recordar dessa noite. Ventos do outro mundo? Lera certa vez alguma coisa sobre demônios que invadem o sono das mulheres para copular com elas, lendas medievais. A história não lhe saíra da cabeça.

"Demônios... não sabia que pudessem ser tão competentes", você pensará, permitindo-se afinal brincar um pouco. Bem competentes... Mas não, não — você sacudirá a cabeça, abandonando tal absurdo, e voltará aos afazeres. Entrar no sonho dos outros, imagina, seria o fim do mundo...

"Mas e se fosse possível? E se realmente eles pudessem..." "Não, não, foi tudo um sonho" — você repetirá mais uma vez, lutando contra a vontade que arde de vê-lo novamente. Foi apenas um sonho louco e alguma coincidência. E além do mais há muito que essas coisas não existem.



*Ricardo Kelmer é escritor, letrista e roteirista e mora em São Paulo, Terra, 3.ª Pedra do Sol


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