19 janeiro 2011

JORNADA COMO METÁFORA


Ir como se quer*

“Tenho proposta de outro palestrante por um terço do valor que você pediu!” — Era o comprador de uma grande empresa, durante concorrência para uma série de palestras que eles queriam contratar. Eu já havia esgotado meus argumentos lógicos e o que fiz foi corrigir o sujeito: 
- Meu caro, onde você disse “valor”, quis dizer “preço”. 
Em seguida, dei-lhe uma aula: 
“Valor e preço são coisas diferentes, quer ver? Após uma viagem acidentada e cansativa você chega ao aeroporto de Cumbica. Seu carro, é claro, está no aeroporto de Congonhas. Você tem algumas escolhas: pode, por exemplo, tomar um ônibus circular até o Tatuapé, de onde pegará outro para Congonhas. O preço é cerca de R$ 7,00 e o deslocamento levará no mínimo uma hora e meia. Você também pode optar pelo Airport Bus Service, direto de Cumbica para Congonhas. Gastará uns R$ 40,00 e levará 50 minutos. Se preferir um taxi, pagará no mínimo R$ 120,00 e levará uns 45 minutos. Mas você poderia alugar uma limusine pagando R$ 1.000,00. Levaria um pouco mais de tempo que o taxi, mas que conforto!"
Resumindo, dá pra fazer Cumbica - Congonhas gastando R$ 7,00, R$ 40,00, R$ 120,00 ou R$ 1.000, 00. 
Levar você de onde você não quer estar para onde você quer estar é a corrida, qualquer um faz, só varia o preço. E cá entre nós, uma corrida entre Cumbica e Congonhas não vale R$ 120,00, muito menos R$ 1.000,00. Mas você não está comprando só ‘uma corrida’. É o quanto de rapidez, conforto e segurança você deseja que determinará o valor da corrida. Para um mochileiro com pouco dinheiro, enfrentar várias paradas, ônibus sem conforto, carregar a bagagem e sujeitar-se a atrasos gastando apenas R$ 7,00 é um ótimo negócio. Mas para um empresário buscando rapidez, conforto e segurança, não. Dependendo das circunstâncias, R$ 120 ou até mesmo os R$ 1.000,00 podem ser aceitáveis.
Quem compra uma palestra apenas para preencher uma janela num evento ou entreter as pessoas enquanto não chega a hora do jantar, está comprando “uma corrida”, um serviço comum, sujeito a leilões. Dá para escolher o mais baratinho. E aí eu fico caro, pois não vendo palestras. 
O que eu vendo é a habilidade de transformar 17 anos de educação formal, 30 anos de experiência profissional, 54 anos de experiência de vida, centenas de livros lidos, cinco livros escritos, muitos sucessos e muitas quebradas de cara, viagens inusitadas e milhares de reuniões e reflexões, numa argumentação capaz de encantar a platéia e levá-la a agir de forma a atender aos objetivos de quem me contratou, trazendo resultados para seu negócio.

A palestra é apenas o processo de entrega. Uma corrida.
E finalizei: "Se você quer preço, experimente o ônibus comum. Se quer um pouco mais de conforto, experimente o Airport Bus Service. Mas se você busca algo criativo, excepcional, único e sensorial, que marque definitivamente, não tem jeito: tem que ser de limusine. E essa experiência eu vendo.”
Não ganhei a concorrência. O comprador só conseguia entender "preço".
Foi de ônibus.

*Luciano Pires é palestrante, executivo, comunicador, focado em despertar o pensamento crítico, lateral, com foco na solução de problemas. Imagem em glimboo.com

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www2.lucianopires.com.br 

11 janeiro 2011

TUMORES MALIGNOS

Lamentável Congresso*


Ganhar um bom salário é bom. Ganhar um ótimo salário é ótimo. Mas muito melhor do que isso é poder determinar o valor do próprio salário: que o digam os parlamentares brasileiros que, recentemente, deram-se um estrondoso aumento.

Fizeram isso despudoradamente, com a desculpa de que eles, os senadores, o Presidente, o vice e os ministros de Estado devem ganhar o mesmo que os juízes do STF, que recebem o salário máximo do funcionalismo público.

Foi um "aumentinho bobo", de 62%, quando a inflação acumulada desde o último aumento foi de 20%. Um "aumentinho besta", que elevará seus salários de R$ 16,5 mil para R$ 26,7 mil.

Um "aumentinho" que causará um efeito cascata, aumentando também os salários de vereadores e deputados estaduais.
Indignação, asco e revolta — é o que nos inspiram, cada vez mais, nossos deputados e senadores.

Enquanto o salário mínimo sua e sofre para acompanhar a inflação, os parlamentares presenteiam-se com estupendos salários, zombando dos idiotas que os elegeram. Eles, que deveriam ser representantes do povo, transformaram-se em tumores malignos da sociedade.

Louve-se a esperteza de Suas Excrescências: aprovaram o aumento, sorrateiramente, pouco antes do Natal, quando a atenção do País inteiro se volta para compras, férias, viagens e réveillon

Com isso, a partir de fevereiro um assalariado precisará de quatro anos para ganhar o que um parlamentar embolsa num único mês, e com a diferença de que este tem 14.º e 15.º salários, verbas extras a perder de vista e só trabalha três dias por semana. E ainda pode aumentar o próprio salário.

Há os que protestam, felizmente. Homenageado pelo Senado com a comenda Direitos Humanos Dom Helder Câmara, oferecida aos que se destacaram em favor dos Direitos Humanos, Dom Manuel Edmilson da Cruz, bispo de Limoeiro do Norte, no Ceará, viajou a Brasília mas recusou a homenagem. 

Em discurso no Plenário da Casa, disse que o aumento era um atentado aos direitos humanos dos brasileiros. Falou por todos nós, os indignados.

O salário do tumores parlamentares é só um item. Incluindo todos os benefícios a que Suas Excrescências têm direito, cada um deles custará para nós, os eleitores idiotas, em média, R$ 140 mil mensais. 

É muita grana. Daria pra comprar meio milhão de ovos. Ou para manter um bandido em um presídio de segurança máxima por 29 dias.
Tirando uma mísera parcela que realmente trabalha pelo bem-estar do povo, nossos políticos usam o mandato apenas para legislar em nome de seus interesses pessoais.

Para esses pilantras, o voto obrigatório é vantajoso, pois mantém baixo o nível médio de senso crítico do eleitorado. Se não fosse obrigatório, só fariam questão de votar os que realmente sabem da importância de seu voto.

Infelizmente, o sistema eleitoral permite também que candidatos com menos votos sejam eleitos, graças a candidatos do mesmo partido ou coligação que receberam muitos votos. 

Isso faz com que o "voto de protesto" piore a situação: foi o que aconteceu com o palhaço Tiririca, que foi feito candidato somente para arrastar com ele alguns colegas menos votados.

Ao saber do aumento salarial, o palhaço mais votado do País comemorou, fazendo piada com o dinheiro alheio. Começou mal.

No site peticaopublica.com.br há um abaixo-assinado onde nós, os idiotas, podemos protestar contra o aumento. Não é isso, obviamente, que resolverá o problema, mas é o mínimo que um cidadão indignado deve fazer.

Ah, ia me esquecendo. Com o que gastamos todo mês com um desses tumores malignos de Brasília, daria para comprar 1.320 guilhotinas, tamanho grande. Bem afiadas.



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*o indignado escritor e roteirista Ricardo Kelmer mostra mais facetas de sua rotina em blogdokelmer.wordpress.com
.
Dos 318 deputados presentes à sessão de 15/dez, 35 se posicionaram contra a urgência para votar o projeto de aumento dos salários. Foram eles:
Henrique Afonso (PV-AC), Luiz Bassuma (PV-MG), Augusto Carvalho (PPS-DF), Magela (PT-DF), Capitão Assumção (PSB-ES), Lelo Coimbra (PMDB-ES), Sueli Vidigal (PDT-ES), Vander Loubet (PT-MS), Luiz Couto (PT-PB), Major Fábio (DEM-PB), Alfredo Kaefer (PSDB-PR), Assis do Couto (PT-PR), Gustavo Fruet (PSDB-PR), Marcelo Almeida (PMDB-PR), Reinhold Stephanes (PMDB-PR), Takayama (PSC-PR), Raul Jungmann (PPS-PE), Chico Alencar (PSOL-RJ), Cida Diogo (PT-RJ), Fernando Gabeira (PV-RJ), Luciana Genro (PSOL-RS), Paulo Pimenta (PT-RS), Eduardo Valverde (PT-RO), Ernandes Amorim (PTB-RO), Mauro Nazif (PSB-RO), Décio Lima (PT-SC), Dr. Talmir (PV-SP), Emanuel Fernandes (PSDB-SP), Fernando Chiarelli (PDT-SP), Ivan Valente (PSOL-SP), José C. Stangarlini (PSDB-SP), Luiza Erundina (PSB-SP), Paes de Lira (PTC-SP), Regis de Oliveira (PSC-SP) e Iran Barbosa (PT-SP).

SAIBA MAIS
>> Petição contra o aumento do salário de deputados e senadores assine em www.peticaopublica.com.br 

>> Assine a petiçãocontra a obrigatoriedade do voto -  https://votoobrigatorionao.com.br/index.php

>> Congresso em Foco: informações sobre as atividades dos parlamentares - http://congressoemfoco.uol.com.br

02 janeiro 2011

NORDESTE: SOPRAM OS VENTOS

Nova convenção desenvolvimentista*


O conceito de "convenção" utilizado no título deste artigo refere-se a uma expressão já consagrada nos textos que tratam do desenvolvimento econômico, significando o "conjunto de crenças compartilhado coletivamente, que tem um papel importante na mobilização da sociedade em torno dos objetivos do desenvolvimento".

É a isso que temos assistido mais recentemente no País — e, particularmente, no Nordeste —, quando o sentimento geral traduz a opção pelo crescimento econômico, impulsionado pelos maciços investimentos que vêm sendo conduzidos pelo Governo Federal e pelos Estados.

Os indicadores macroeconômicos revelam que o País segue um ciclo virtuoso, possibilitado pela conjunção de políticas públicas coerentes com a promoção do seu desenvolvimento. Como resultado dessas políticas, a taxa média de crescimento real anual do PIB-Produto Interno Bruto passou de 2,5%, no período 1994-2003, para 4,7%, entre 2004 e 2008.

O crédito teve papel importante para estimular essa expansão, uma vez que sua participação, em relação ao PIB, passou de 24,5% em 2004 para 45% em 2009. A contribuição dos bancos públicos para o crédito bancário representou 82%, destacando-se, principalmente, a contribuição deles no período pós-crise financeira internacional, para contrabalançar a significativa redução da disponibilidade de crédito privado para as empresas.

Na realidade, a política de desenvolvimento do Governo Federal tem sido direcionada para estimular investimentos com vistas a consolidar e expandir a liderança em setores estratégicos, como de petróleo e gás natural, bioetanol, carnes, mineração, papel e celulose, siderurgia e do complexo aeronáutico. E essas políticas, de caráter nacional, vêm tendo rebatimentos importantes nas regiões.

Ao lado disso, há também, ações federais de recorte regional, traduzidas pelos investimentos públicos para viabilização de grandes empreendimentos como a Transposição do Rio São Francisco, a Transnordestina, as Refinarias e as duplicações de BRs, os quais deverão ser concluídos ao longo do próximo Governo Dilma, proporcionando mudanças estruturais em nossa economia.

Estes investimentos traduzem bem o esforço do Governo Federal para equacionar problemas históricos que afligem boa parte da população, principalmente os relacionados com a elevada pobreza e as desigualdades, tanto em termos pessoais, quanto espaciais.

Quando o Governo Federal prioriza o combate à pobreza e a redução das desigualdades regionais tende, naturalmente, a orientar suas ações para as regiões Norte e Nordeste. No Nordeste, de modo peculiar, tais políticas são fundamentais, pois têm estimulado o surgimento de subespaços, cuja dinâmica tem gerado encadeamentos produtivos, abrindo possibilidades para o desenvolvimento de novos setores vinculados às cadeias produtivas regionais, além de exporem os principais gargalos logísticos regionais, passando a requerer ações mais estratégicas da União para a inserção da região no contexto econômico nacional.

Daí a razão desses grandes investimentos estruturadores, como é o caso da Transnordestina — que vai ter um impacto importante na logística regional —, contribuindo, certamente, para a melhoria da competitividade da nossa economia.

Junto à ampliação e modernização dos portos de Itaqui, Suape e Pecém, cuja capacidade operacional irá demandar um maior volume de cargas provenientes de outras regiões do País, a Transnordestina vai ligar as áreas dinâmicas do interior do Nordeste, produtoras de grãos (Sul do Maranhão e Piauí e Oeste da Bahia), frutas (Vale do São Francisco) e gesso (Araripina/PE) com os portos de Pecém/CE e Suape/PE.

Além disso, a integração estratégica da Transnordestina com a ferrovia Norte-Sul vai viabilizar o escoamento da produção da riqueza produzida no Centro-Oeste do País através dos principais portos nordestinos, que apresentam condições operacionais bem melhores do que as de qualquer outro porto do Brasil, além da localização estratégica mais próxima aos mercados americano e europeu.

Na área de energia, além dos investimentos na complementação das linhas de transmissão de alta tensão e a multiplicação de projetos no âmbito do PROINFRA, implementando pequenas centrais hidrelétricas, o Nordeste apresenta também elevado potencial para o aproveitamento de energia eólica, fotovoltaica e de biomassa, garantindo uma matriz energética não poluidora, capaz de atender a qualquer acréscimo de demanda decorrente do crescimento econômico regional.

Finalmente, na área de infraestrutura, a integração de bacias no Nordeste, através da Transposição do Rio São Francisco, deverá resolver o problema secular de carência hídrica do semiárido nordestino, viabilizando a utilização dos recursos hídricos para fins econômicos e de consumo humano, dentro do princípio da sustentabilidade ambiental.

Portanto, as perspectivas de manutenção da atual convenção desenvolvimentista nos dão a certeza de que todos esses grandes empreendimentos deverão estar concluídos a curto ou médio prazos, o que nos permite estabelecer um cenário otimista quanto às possibilidades de continuarmos evoluindo em termos de melhoria das condições de vida da população nordestina, especialmente da residente no semiárido.


*Adriano Sarquis Bezerra de Menezes é economista, Doutor em Economia da Indústria e da Tecnologia, Mestre em Economia, Especialista em Administração pelo MIT-Massachussets Institute of Technology e professor de Economia da UNIFOR-Universidade de Fortaleza (imagem: www.madphotoworld.com)



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Complementando o pensamento exposto, o leitor Ricardo Perdigão Pamplona comentou (em 03/01/2011 no jornal O Povo) que, "na verdade, a nova idéia de convenção aponta para novos paradigmas, onde o crescimento e o PIB dão lugar a desenvolvimento e IDH, conceitos ainda pouco ou mal utilizados no Brasil. Na visão convencional de desenvolvimento, supunha-se que, alcançando taxas significativas de crescimento econômico, o mesmo 'se derramaria' sobre os setores menos favorecidos, tirando-os da pobreza. Assim, o crescimento seria, ao mesmo tempo, desenvolvimento social. Essa teoria ficou conhecida como 'modelo de derrame', ou seja, não basta o crescimento para solucionar a pobreza.

"Dentro da agenda dominante da globalização, a formação de capital é frequentemente confundida com riqueza, assim como o crescimento é igualado ao desenvolvimento. De maneira inversa, a criação de riqueza é a geração de um pool holístico de recursos para o desenvolvimento, e não apenas para o crescimento, e que, por sua vez, poderia se tornar a base da regeneração de recursos. A crise do pensamento econômico convencional abre uma oportunidade para que, na busca de um modelo mais compreensivo, abrangente e integral do desenvolvimento, se incorporem de forma legítima as dimensões culturais do mesmo.

"Assim, o desenvolvimento é, hoje, entendido como 'desenvolvimento cultural', em cujo cerne se encontram a criação, a produção e o intercâmbio de sentidos e as apropriações individuais e sociais, entendidas como processos dinâmicos. Finalizando, e do ponto de vista prático, os economistas costumam admitir que existam efeitos diretos sobre o emprego e a renda, em produtos culturais tradicionais como o artesanato e o turismo cultural — infelizmente ainda pouco explorados entre nós."



E TEMOS AINDA o discurso de posse da Presidente Dilma Rousseff, que dia 1.º de janeiro focalizou a importância da cultura para o desenvolvimento do País:

“Pela primeira vez o Brasil se vê diante da oportunidade real de se tornar, de ser, uma nação desenvolvida. Uma nação com a marca inerente também da cultura e do estilo brasileiros – o amor, a generosidade, a criatividade e a tolerância.

(…)
Mas o caminho para uma nação desenvolvida não está somente no campo econômico ou no campo do desenvolvimento econômico pura e simplesmente. Ele pressupõe o avanço social e a valorização da nossa imensa diversidade cultural. A cultura é a alma de um povo, essência de sua identidade.

Vamos investir em cultura, ampliando a produção e o consumo em todas as regiões de nossos bens culturais e expandindo a exportação de nossa música, cinema e literatura, signos vivos de nossa presença no mundo.

Em suma: temos que combater a miséria, que é a forma mais trágica de atraso, e, ao mesmo tempo, avançar investindo fortemente nas áreas mais modernas e sofisticadas da invenção tecnológica, da criação intelectual e da produção artística e cultural. 

Justiça social, moralidade, conhecimento, invenção e criatividade devem ser, mais que nunca, conceitos vivos no dia a dia da nossa nação.”