26 agosto 2006

DOIS BRASIS 1

O maravilhoso e o incompetente


Quando contemplo o mundo e olho o Brasil, concluo que este País não é competitivo. No entanto, desfruta de ilimitadas chances de se tornar uma das maiores nações do planeta. Basta nos comparar com o Japão, esmagado pelos americanos em 1945, paupérrimo em recursos naturais, localizado entre gigantes (China, União Soviética, tigres asiáticos), rodeado de vulcões por todos os lados, falando um idioma complicado, e mesmo assim, o segundo PIB mundial, ancorado na excelência da população, sobretudo da mão-de-obra, e numa refinada elite governamental e empresarial.

E o Brasil, possuidor de recursos abundantes e ainda patinando como ilustre desconhecido, quando muito em fase de desenvolvimento, apesar da baixa taxa de crescimento até na América Latina. Ao cotejar o desenvolvimento e o crescimento chinês com o brasileiro, ficamos atordoados. Continuamos bloqueados por vários condicionantes internos. Um deles, o auto-engano de eterno ''País do Futuro''. E esse futuro não chega. Nessa falta de competitividade globalizada, entram vários fatores. Um deles, a ''incompetência brasileira''.

Em outro artigo, afirmei: ''O Brasil dispõe de uma cultura, neste alvorecer do século XXI, extremamente pecaminosa, lesiva, banhada pela corrupção, por uma notória incompetência.'' E, acrescentei, ''nada funciona aqui ou funciona de maneira improvisada, a não ser que o indivíduo não tenha olho crítico, seja conformista, alienado''. Não reclama, não luta pelos seus direitos e ainda estimula a mediocridade e o erro. Ambos são protegidos, por causa da ''solidariedade da mediocridade''. E, prossegui, ''se ele tiver um mínimo de cidadania, será um eterno revoltado. A incompetência está ramificada em todos os setores''.

Não tenho medo dos incompetentes nem dos medíocres. Tenho uma enorme insegurança, inquietação com a ''solidariedade'' dos incompetentes e dos medíocres. Eles se irmanam entre si, fechando todas as portas para quem tem um mínimo de talento. A incompetência foi plantada já no descobrimento pelos portugueses, revelando naquela época — há mais de 500 anos — uma miopia imperdoável. Chegaram aqui no século XV e levaram 30 anos para retornar às plagas nacionais, porque não perceberam as nossas potencialidades e riquezas. Só retornaram após se sentirem acossados pelos piratas europeus que começaram a nos cercar.

Outro indicador de incompetência (talvez mais de corrupção), o escrivão da Frota Pero Vaz de Caminha, na primeira carta ao Rei de Portugal, no meio de um texto superficial, pedia um emprego para seu sobrinho. Outra luz na construção da incompetência nacional ocorreu com os primeiros passos da educação escolar, que vem se deteriorando ao longo dos séculos, chegando agora ao fundo do poço. As aulas ministradas pelos jesuítas no começo da colonização, uma imposição aos silvícolas de valores, ideologias, visões importadas sem nenhum compromisso com a realidade local.

Essa distorção continua, com uma desvantagem: transmissão de utopias intermediadas por ineficazes e mal-intencionados processos pedagógicos. Portanto, no momento da elaboração deste artigo, o Brasil se apresenta assentado em dois pilares. De um lado, uma nação maravilhosa para se viver, do ponto de vista geográfico. A geografia brasileira é incomparável. Único País do mundo a preencher todas as necessidades autênticas do ser humano, daí a luta dos estrangeiros — por exemplo, os executivos — em querer continuar residindo aqui.

O Brasil oferece tudo para o indivíduo passar a existência levando uma vida saborosa, prazerosa. Amplo, rico e atraente litoral, praias deslumbrantes, clima ameno, nação agradável, sem terremoto, sem terrorismo, povo bom, de excelente relacionamento, de estimulante convivência, onde se desfruta de privilegiados espaços de sobrevivência. Só morre de fome quem detesta trabalhar, tem cabeça truncada e o lazer, a ociosidade por opção. Mas quem possui um mínimo de inteligência, vontade de dar duro, usufrui de todas as condições para viver dignamente.

Há uns 10 anos fiz uma viagem de estudos dentro de um programa de formação e desenvolvimento de executivos internacionais com alunos da Universidade de São Paulo (USP), visitando seis países europeus. Numa reunião com um dos diretores da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra, um dos alunos perguntou ao diretor do órgão as possibilidades de ele fazer uma carreira trabalhando na Suíça. O executivo foi enfático na resposta: ''Nem pensar nesse desejo. Volte para o Brasil, porque lá se encontram notáveis atrações.'' E completou: ''Aqui na Europa todos os espaços estão ocupados''.

Outras ilustrações do Brasil maravilhoso. Na coordenação da programação dos alunos de MBA da Whorton, conceituada e famosa escola de negócios dos Estados Unidos e uma das mais credenciadas do mundo, com sede na Filadélfia, incluí Fortaleza. Ficaram nesta cidade 10 dias. Ao término do estágio na capital do Ceará, fui procurado por eles. Isso me preocupou. Em resumo, a questão central deles era a seguinte: ''Professor Cléber Aquino, será que há possibilidades de nós trabalharmos em Fortaleza ou de montar um negócio?'' Fiquei perplexo com esta interpelação.

São considerados os melhores estudantes do mundo em Gestão, preparados para presidir corporações globais, multinacionais, jovens viajados, poliglotas, filhos de ricos e estudantes nos Estados Unidos. E querendo viver e trabalhar no Brasil/Nordeste. Constantemente sou procurado por estrangeiros cursando disciplinas na USP, com os mesmos interesses. Um deles francês, residindo em Paris ao lado da Torre Eiffel, terminando o doutorado no Canadá, sua idéia fixa é morar no Brasil. Procurei mergulhar nas motivações deles, principalmente dos alunos da Whorton.


Por unanimidade, afirmaram que o Brasil mexeu com a cabeça deles, passaram a questionar se valia continuar no tal do "primeiro mundo", considerando a qualidade de vida aqui. Por outro lado, na paralela desse Brasil maravilhoso, deslumbrante, encanto dos estrangeiros, nós brasileiros somos metralhados por um show de incompetência, indo desde o porteiro de um prédio residencial à Presidência da República, e daí ao parque empresarial, aos profissionais liberais, enfim, em todos os segmentos nacionais. Até a corrupção é conduzida de maneira incompetente.


VÁ ALÉM
Cleber Aquino é professor da Universidade de São Paulo (USP), consultor de Alta Gestão e coordenador dos 6 volumes de História empresarial vivida – Depoimentos de empresários brasileiros bem-sucedidos (Editora Gazeta Mercantil, 1986 – compre em http://www.livronet.com.br/produtos.php?codigo=189084). Escreve quinzenalmente aos domingos para a coluna Análise Econômica do jornal O Povo
www.opovo.com.br

20 agosto 2006

INTERAÇÃO SIGNIFICANTE

Eles não são apenas formas


"Gêneros são formas de vida, modos de ser. São frames para cada ação social. São ambientes para aprendizagem. São os lugares onde o sentido é construído. Os Gêneros moldam os pensamentos que formamos e as comunicações através das quais interagimos. Gêneros são os lugares familiares para onde nos dirigimos para criar ações comunicativas inteligíveis uns com os outros e são os modelos que utilizamos para explorar o não-familiar."

(Charles Bazerman)

Uma semana cheia esta em Fortaleza, com a 7.º Bienal Internacional do Livro inundando de literatura a cidade. Entre os lançamentos e boas opções de compra, destacou-se o evento paralelo Festival Internacional de Ilustração de Fortaleza — uma série de palestras, debates, exposição, oficinas e lançamentos, até 27 de agosto no Centro de Convenções, com curadoria dos artistas Daniel Diaz, Rafael Limaverde e Weaver Lima.

Na enxuta e expressiva exposição, tematizada como Mostra 1001 Utilidades, figuram trabalhos de 30 artistas da ilustração, quadrinhos, charge, cartum e caricatura, na ordem: Audifax, Carlus, Clayton, Damião, Daniel Brandão, Daniel Diaz, Denilson Albano, Franklin de Oliveira, Geraldo Jesuíno, Guabiras, Hemetério, Ivna Mourão, Jefferson, JJ Marreiro, Klévisson, Viana, Lilá, Lobo, Lupin, Marcílio S., Mário Sanders, Mariza Viana, Maurício Silva, Mino, Newton Silva, Nice Estrigas, Rafael Limaverde, Sinfrônio, Thyago, Valber Benevides, Weaver Lima. Se estiver na área vá ver, no Bloco B, sala B5.

...e na 7.ª Bienal...
Entre as boas edições trazidas ao evento, Charles Bazerman, lingüista e professor na Universidade da Califórnia, marca presença intelectual com sua obra Gênero, agência e escrita (lançada no Brasil pela Cortez Editora). A abordagem de "gênero" por ele delineada vai além do gênero como constructo formal, para vê-lo como ação tipificada pela qual podemos tornar nossas intenções e sentidos inteligíveis para os outros. Como resultado, o gênero é o que "dá forma a nossas ações e intenções". É um meio de "agência" e não pode ser ensinado divorciado da ação e das situações dentro das quais aquelas ações são significativas e motivadoras.

Bazerman está bem alerta para o "detalhe" de que, assim como as ações, intenções e situações humanas, uma "teoria de gênero" precisa ser dinâmica e estar sempre mudando. Segundo o autor, na medida em que os alunos aprendem que sua escrita não somente pode afetar as pessoas na sala de aula e na comunidade, mas também pode levar significados e intenções para outras pessoas que não conhecem pessoalmente, eles focam mais atenção no mundo de interação criado dentro do texto. "O texto se torna um lugar onde a interação significante acontece, em vez de ser acessório à interação face-a-face enriquecida com uma história pessoal."

O mistério de como ações podem ser criadas à distância através de significados criados em um texto é o tema do capítulo final Performance textual: Localizando a ação à distância. "Quando os alunos podem fazer seus textos terem vida para leitores à distância, criando interação dos significados evocados pelo texto, eles terão alcançado a agência mais profunda da escrita”, descreve Bazerman. Esta é uma obra certamente indicada para estudantes e pesquisadores nas áreas de Educação, Letras, Comunicação e Ciências Sociais.


SERVIÇO
Gênero, agência e escrita, por Charles Bazerman
Organizadoras: Judith Chambliss e Angela Paiva Dionisio
144 páginas, R$ 26

17 agosto 2006

EPISÓDIOS PARA SETEMBRO

Mais 11 super-heróis em ação


Virar gente grande pode ser difícil para uma criança, mas em Robotboy, que faz sua estréia no canal Cartoon Network, um andróide adolescente é criado por um cientista japonês para ser um robô guerreiro, porém com sentimentos e emoções humanas. É importante o herói não cair em mãos erradas e, por isso, ele vive com seu grande amigo Tommy.

Tommy Turnbull é um menino de 10 anos de idade, sensível e inteligente, que possui um grande segredo. Seu brinquedo favorito, guardado com cuidado em seu quarto, é um robô chamado Robotboy. Com um simples comando no seu relógio de pulso, Tommy consegue ativá-lo e colocá-lo em ação. Normalmente, Tommy anda com o brinquedo desativado, exceto quando está em perigo.

Quando acionado por Tommy, Robotboy torna-se um robô do tamanho de uma criança… grande, forte e guerreira. Se chamado para tirar seus amigos de uma situação de risco, Robotboy se revela um equipamento ultramoderno, pronto para o combate. No passado, Robotboy foi criado pelo Professor Moshimo para participar de um concurso de televisão de luta de robôs. Porém, o malvado doutor Kamikazi descobre a invenção do cientista japonês e tenta apoderar-se da máquina, a fim de dominar o mundo. Para protegê-lo, o Professor Moshimo entrega-o a Tommy, seu principal admirador. O menino deverá mantê-lo a salvo, com a ajuda de seus amigos Gus e Lola.

Para combater outros vilões, o Cartoon Network traz em setembro novos episódios de Ben 10, que continua surpreendendo com os poderes novos e espetaculares que ganha quando o Omnitrix o transforma em qualquer um dos dez heróis alienígenas.

A criançada poderá juntar-se a Ben, enquanto ele aprende a lidar com seus novos poderes: para começar, ele será obrigado a enfrentar três alienígenas caçadores de recompensas. E ainda conhece um mutante superlegal… ou será que ele não é tão legal assim? Ben também terá que superar o seu medo de palhaços. Mais que tudo, o garoto precisa adaptar-se ao Omnitrix, com todos os problemas que isso pode trazer, enquanto assume o papel de defender os inocentes.


SOBRE O CANAL
Cartoon Network para a América Latina é a rede de cabo e satélite da Turner Broadcasting System, Inc. que oferece 24 horas com animação da maior filmoteca mundial de desenhos animados, além de programas originais como As meninas superpoderosas, O laboratório de Dexter, Du, Dudu e Edu, KND – A turma do bairro, A mansão Foster para amigos imaginários, Hi Hi Puffy AmiYumi, O acampamento de Lazlo, A vida e aventuras de Juniper Lee, Meu amigo da escola é um macaco e Ben 10.

O Cartoon Network para a América Latina é a rede a cabo mais assistida da região, disponível em 19,2 milhões de lares. Lançada na América Latina em 30 de abril de 1993, a rede é transmitida em Português, Espanhol e Inglês.

ACESSE
www.cartoonnetwork.com.br


ASSISTA
Robotboy — sábados, às 11h30 (a partir de 2 de setembro)
Ben 10 — sextas, às 19h30 (a partir de 1.º de setembro)


É TEMPO DE INSTIGAR

Para um novo senso comum


Lançar os fundamentos de uma nova cultura política, que permita voltar a pensar e a querer a transformação social e emancipatória. Este é o objetivo central do livro A gramática do tempo: Para uma nova cultura política, do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos.

Editado no Brasil pela Cortez Editora, o livro trata da reconstrução da tensão entre regulação social e emancipação social como condição para o retorno ao que foi designado como “epistemologia do Sul” — um pensamento alternativo de alternativas.

Ante o colapso do contrato social da modernidade ocidental capitalista e colonial e a proliferação de fascismos sociais, é necessário reinventar a democracia, a cultura política e o próprio Estado. Como opção à democracia de baixa intensidade que hoje domina são propostas formas de democracia de alta intensidade, através das quais é possível expandir os espaços públicos, tanto estatais como não-estatais. Neste volume(*), as análises centram-se em articulações entre os espaços-tempo local, nacional e global: aqui se infiltram idéias articuladas em sistemas e redes.

Boaventura analisa, em especial, a complexa transição de uma "teoria crítica pós-moderna" para uma "teoria crítica pós-colonial". "É uma passagem complexa, porque nem sempre a segunda anula a primeira, nem qualquer delas responde adequadamente às passagens que continuo explorando. A minha crítica da modernidade ocidental — concebida quer como paradigma epistemológico, quer como paradigma sócio-cultural — nunca se identificou com as concepções pós-modernas dominantes entre os autores do Atlântico Norte. Nunca deixei que a crítica dos modos modernos de transgressão boicotasse a idéia de transgressão. Nunca perdi de vista que a desconstrução da modernidade e da crítica moderna da modernidade não deveria envolver a desconstrução da aspiração a uma sociedade mais justa e mais solidária, e muito menos o desarme das lutas de resistência contra a injustiça e a opressão", explica o autor.

Pelo contrário, foi o rearme, não o desarme, o que moveu o seu trabalho teórico, crítico e analítico e, daí, a sua caracterização do tempo de transição que vivemos: confrontamos problemas modernos (igualdade, liberdade, fraternidade, paz) para os quais não há soluções modernas, dadas as inadequações reveladas pelo liberalismo, o progresso, o marxismo, a revolução e o reformismo. Seja como for, o autor recusa-se a ter uma concepção pós-moderna da pós-modernidade. E caracteriza sua posição como o pós-modernismo de oposição, uma designação que confronta o que denominou pós-modernismo celebratório, "a posição daqueles que passaram da crítica das concepções modernas de transformação social emancipatória ao abandono da própria idéia de emancipação social", complementa.


SOBRE O AUTOR
Boaventura de Sousa Santos, nascido em Coimbra, é doutor em Sociologia do Direito pela Universidade de Yale (1973), professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e Distinguished Legal Scholar da Universidade de Wisconsin-Madison, diretor do Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, além de diretor do Centro de Documentação 25 de Abril daquela instituição. Recebeu o Prêmio de Ensaio Pen Club Português (1994), Prêmio Gulbenkian de Ciência (1996), Prêmio Bordalo da Imprensa – Ciências (1997), Prêmio Jabuti – Área de Ciências Humanas e Educação (Brasil, 2001), Prêmio Euclides da Cunha da União Brasileira de Escritores (Rio de Janeiro, 2004), Prêmio “Reconocimiento al Mérito”, da Universidade Veracruzana (México, 2005), e Prêmio de Ensaio Ezequiel Colômbia Estrada da Casa de las Américas (Cuba, 2006).


LIVROS PUBLICADOS (seleção)
Um discurso sobre as ciências, Porto, Afrontamento, 1988 (14.ª edição), publicado pela Editora Cortez, São Paulo, 2003 (4ª edição); Introdução a uma ciência pós-moderna, Porto, Afrontamento, 1989 (6.ª edição), publicado por Graal, São Paulo (3.ª edição); Estado e sociedade em Portugal (1974-1988), Porto, Afrontamento, 1990 (3.ª edição); Pela mão de Alice: O social e o político na pós-modernidade, Porto, Afrontamento, 1994 (8.ª edição), publicado pela Editora Cortez, 1995 (10.ª edição) e na Colômbia, Ediciones Uniandes (1998); Toward a new common sense: Law, science and politics in the paradigmatic transition, New York, Routledge, 1995; Os tribunais nas sociedades contemporâneas: O caso português (org.), Porto, Afrontamento, 1996; La globalización o el derecho: los nuevos caminos de la regulación y la emancipación, Colômbia, ILSA, Ediciones Universidad Nacional de Colombia, 1998; e Reinventar a democracia, Lisboa, Gradiva, 1998 .

(*) O volume A gramática do tempo: Para uma nova cultura política é o quarto da obra “Para um novo senso comum: A ciência, o direito e a política na transição paradigmática”, publicada originalmente em inglês, Toward a new common sense: Law, science and politics in the paradigmatic transition (New York, Routledge, 1995), e amplia profundamente a reflexão aí apresentada. O objetivo desta obra é desenvolver epistemologias e teorias sociais que travem a proliferação da razão cínica, que alimentem o inconformismo contra a injustiça e a opressão e, por fim, que permitam reinventar os caminhos da emancipação social. Os demais volumes são: A crítica da razão indolente: Contra o desperdício da experiência; O direito da rua: Ordem e desordem nas sociedades subalternas; e Os trabalhos de Atlas: Regulação e emancipação na Redopolis.


SOBRE A EDITORA E O MERCADO EDITORIAL
  • Atuação no mercado:
    Fundada em 1980 (originou-se da Cortez & Morais, antes localizada atrás da PUCSP), a Cortez Editora tem em catálogo cerca de 800 títulos nas áreas de Educação, Serviço Social, Sociologia, Meio Ambiente, Lingüística, Psicologia, Fonoaudiologia e Literatura Infanto-juvenil. Seu público-alvo central compõe-se de alunos e professores universitários, pesquisadores e interessados nas Ciências Humanas, além de alunos até 14 anos de escolas públicas e privadas.
  • Principais títulos:
    Aqui figuram A importância do ato de ler de Paulo Freire e Metodologia do trabalho cientifico de Antonio Joaquim Severino (mais de 250 mil exemplares vendidos) e, mais recentemente, na área de Literatura Infanto-juvenil, o livro Na minha escola todo mundo é igual, de Rossana Ramos (mais de 30 mil exemplares vendidos).
  • Projeto Nossa Capital:
    A coleção Nossa Capital conta com três livros — São Paulo: De colina a cidade; Fortaleza: De dunas andantes a cidade banhada de sol; e Natal: A noiva do sol —, lança mais dois na Bienal Internacional do Livro de Fortaleza que ocorre este mês, focalizando Brasília e Curitiba e, ainda em 2006, a elas juntar-se-ão Recife, Vitória, Belo Horizonte, Salvador, Rio de Janeiro e Manaus. A Coleção deverá estar completa até o final de 2007. A idéia principal é fazer com que professores e alunos comecem a ver sua cidade de outro ângulo, desenvolvendo uma noção de cidadania.
  • Mercado externo:
    Desde 1998, através de projeto direcionado ao mercado de língua espanhola, a Cortez Editora publicou 12 títulos na área de Serviços Social (Biblioteca Latinoamericana de Servicio Social) e 14 títulos na área Infanto-juvenil. As oportunidades de negócios, sejam em que área for, devem levar em conta a globalização e as oportunidades de abertura proporcionadas pelo mercado.
  • Preço do livro impresso:
    Há relação direta entre o preço do livro e o poder aquisitivo da população em geral. Uma das alternativas para a solução deste impasse seria um amplo projeto de reestruturação e manutenção de acervos de bibliotecas — especialmente de Universidades públicas e privadas. Tal ação possibilitaria (no caso do segmento de livros técnicos e científicos) um aumento direto do número de leitores e um aumento das tiragens, possibilitando (a médio e longo prazos) uma queda nos preços de livros. Projeto semelhante, se adotado para as bibliotecas públicas escolares e comunitárias, favoreceria outro segmento de leitores.
  • O leitor:
    Não importa o que o leitor leia, o importante é que leia algo! Dessa forma, o não-leitor poderá ter a chance de iniciar seu processo de construção da leitura. O best-seller, por exemplo, faz com que o leitor seja convidado a entrar numa livraria ou comprar o exemplar em um supermercado ou farmácia. Este tipo de literatura traz uma situação importante para o mercado editorial como um todo, pois contribui para que o livro, nesses casos, seja "desejado" pelo leitor.
  • PNLL-Plano Nacional do Livro e Leitura (http://www.pnll.gov.br) e algumas isenções importantes:
    O PNLL Vivaleitura tornou-se um dos principais canais para discutir o tema "leitura". É muito importante que continue. A desoneração do PIS e Cofins foi fundamental para o mercado editorial e sua cadeia produtiva e distributiva, já que beneficiou principalmente distribuidores e livreiros.
  • Desaparecimento do livro impresso:
    Não acredito no desaparecimento do livro impresso. Todavia, haverá uma readequação, com o advento de novas tecnologias que possibilitarão que mais leitores sejam incorporados, pois o livro — seja qual for seu formato — estará mais acessível e disponível.

por Jose Xavier Cortez (diretor)


SERVIÇO
A gramática do tempo: Para uma nova cultura política, 512 páginas, R$ 59,00
Autor: Boaventura de Sousa Santos
Cortez Editora — Rua Bartira, 317 – Perdizes
05009-000 — São Paulo/SP — Tel.: (11) 3864-0111
cortez@cortezeditora.com.br
www.cortezeditora.com.br

10 agosto 2006

UNIVERSO EM MUTAÇÃO

Obter o corpo desejado, apenas respirando


Através do Rebirthing ou Respiração Consciente podemos ter o corpo que desejamos, baseando-nos no fato de que nosso pensamento é criativo e que com ele criamos a nossa realidade. Assim, podemos tentar seguir uma dieta naturista ou de baixas calorias, mas se não mudarmos a qualidade dos nossos pensamentos a respeito dos alimentos, não obteremos o domínio de nosso corpo físico e não conseguiremos manter o nosso "peso ideal". O Rebirthing nos permite alcançar o domínio absoluto do nosso corpo físico, porque através desta técnica logramos dominar os nossos pensamentos.

Mas por que não funcionam as dietas alimentares? Não funcionam, simplesmente, porque temos fortes crenças arraigadas sobre as comidas e sobre nossa alimentação: cremos que o que comemos faz mal ao nosso corpo ou o engorda, de modo que não podemos desfrutar livremente dos alimentos que escolhemos. Porém, se modificarmos a qualidade dos nossos pensamentos, poderemos comer o que mais nos agrada, sem engordar.

Porém, as crenças são muito fortes e ainda assim somos programados, desde muito pequeno(a)s, com idéias tais como "se você não comer, irá morrer" — e a forma de obter o amor e a aprovação dos nossos pais acaba sendo mesmo "limpando" o prato. Em conseqüência, comíamos em excesso ou sem ter fome, quando em realidade nos poderiam haver ensinado a escutar e sentir os desejos do nosso corpo, que é sábio por natureza e "sabe" quando tem fome, quando precisa comer doce ou salgado, ou apenas não comer...

Sabemos que, quando uma criança não come quando seus pais assim impõem, isto se converte em algo dramático que inevitavelmente transferimos para a nossa vida adulta, e se manifesta como transtornos em nossa alimentação. Comemos "em excesso" ou até comemos as comidas que mais nos agrada saborear com muita culpa, já que cremos fortemente que nos vão engordar ou fazer-nos mal ao fígado, quando estamos ansiosos ou necessitamos amor.

Ao invés de sentirmos o que se passa conosco, tapamos nossas emoções com comida, de forma que nunca estamos satisfeitos. Em vez de pedir amor comemos, sem sequer nos darmos conta se temos fome ou não. É interessante pararmos para pensar o que é que realmente queremos ou pensamos nestes momentos!

De toda forma, não se trata de culpar nossos pais pelas crenças que temos a respeito da nossa alimentação, já que esta síndrome se foi transferindo inconscientemente de geração em geração, mas agora temos a possibilidade de escolher e temos as ferramentas necessárias para produzir em nós uma mudança, se assim o desejarmos.

O excesso de peso muitas vezes é ódio retido — e uma maneira de nos livrarmos disso é através do Perdão, já que quando odiamos alguém estamos cedendo o nosso poder. "Perdôo e sou livre, recupero meu poder e tenho o domínio dos meus pensamentos". Podemos considerar esta como uma fórmula bem prática.

Portanto, quando estamos "conscientes" do pensamento que depositamos em cada uma das coisas que comemos, temos a ferramenta fundamental para poder reverter isso — e assim podemos comer tudo o que desejarmos, quando tivermos vontade, sem engordar ou prejudicar o nosso corpo.

Simplesmente respire e deixe que aflorem os pensamentos que o(a) estão engordando ou fazendo mal ao seu corpo — e que não permitem que você desfrute de comer o que seja nem manter o seu "peso perfeito".


LESLIE THURSTON NO BRASIL
Vamos conhecer Leslie Temple-Thurston (foto), que estará no Brasil de 24 a 27 de agosto no Sítio do Ingá, em Teresópolis/RJ, a convite de Samvara Bodewig e A. Ramyata, para lançar seu livro traduzido em Português e ministrar darshans. É nossa oportunidade de fazer um trabalho intensivo com ela. Estamos aceitando inscrições porque a procura é grande e as vagas, limitadas.

Leslie Temple-Thurston é uma mestra da iluminação. Desde 1988, encaminhou milhares de pessoas no seu desenvolvimento espiritual realizando eventos mundialmente, desde a América do Norte à África do Sul.

Leslie oferece eventos e ecléticos cursos baseados em yoga e influenciados pelas técnicas da Psicologia. Leslie é sul-africana e tem centros nos EUA e África. Fundadora das ONGs Corelight, que se formou para dar apoio aos seus ensinamentos, e Sementes de Luz, que atende órfãos com aids e comunidades marginalizadas na África do Sul, é autora dos livros O casamento do espírito – Vivendo iluminado no mundo de hoje, e Retornando à unidade – As sete chaves da ascensão", traduzido para várias línguas.

Darshan é uma bênção — uma iniciação energética de unidade, amor e compaixão que ajuda significativamente no desenvolvimento espiritual, reorganizando profundamente e oferecendo o potencial para mudanças de vida. Durante seus Darshans, Leslie inclui a meditação, uma palestra sobre a essência, perguntas e respostas.

Durante um darshan, é transmitida uma energia de cura. Leslie faz um discurso espontâneo sobre um assunto relevante aos que estão presentes, falando em estado de samadhi, que promove uma iniciação profunda dentro da unidade de consciência a todos os presentes.

Alguns professores dão o darshan tocando uma pessoa. Os darshans de Leslie acontecem através dos seus olhos, voz e mãos, e são uma transmissão de elevada energia de cura, conhecida no Oriente como Shakti.


PARTICIPE
deste e outros programas de Terapia da Respiração: converse e informe-se com a terapeuta renascedora
ramyata@terra.com.br

SAIBA MAIS
sobre a técnica do Rebirthing ou Respiração Consciente
http://www.veenamukti.com/04_terapiarespiracao.htm

CONTATE
a especialista Cecilia Pereyra, autora do texto inicial desta coluna
cpereyra@cdc.unrc.edu.ar

07 agosto 2006

COSPLAY CHAMPIONS

Brasil fatura o WCS 2006


Os irmãos Mônica e Maurício Somenzari receberam o título mundial no maior concurso de cosplayers do mundo. Representando o Brasil pela primeira vez no evento — o World Cosplay Summit 2006 —, a dupla Somenzari superou adversários fortíssimos e conquistou o 1.º lugar na grande final realizada domingo (6 de agosto), em Nagoya (Japão).

O megaevento promovido pela TV Aichi reuniu os melhores cosplayers — nome dado a pessoas que vestem fantasias (do inglês costumes) e atuam (são players, ou atores) como seus personagens preferidos de mangás e animês (respectivamente, histórias em quadrinhos japonesas e desenhos animados japoneses) — de todo o planeta. Resultado: os representantes do Brasil levaram a melhor, superando até mesmo as duplas do Japão, que têm óbvia tradição no universo cosplay.

Maurício e Mônica apresentaram-se como os personagens Rosiel e Alexiel, do animê Angel Sanctuary — atuação que já lhes havia valido o primeiro lugar na etapa brasileira do WCS 2006 (promovida pela Editora JBC), o que lhes valeu a classificação para a fase final no Japão. Na ordem das apresentações, os países participantes do concurso foram: Itália, Cingapura, Japão (representado por três duplas), Alemanha, China, Espanha, Tailândia, França e, por último, o grande campeão Brasil, cuja dupla representante foi, também, a mais aplaudida.

Mônica Somenzari revelou, após o anúncio da vitória, que não esperava ganhar o concurso "porque os outros concorrentes eram muito bons". Já Maurício pensava diferente: "Eu tinha uma certa esperança. Quando anunciaram o terceiro e o segundo lugares, tive a sensação de que algo de bom ia acontecer", disse o emocionado vencedor, que chegou às lágrimas de alegria.

Verdadeira lenda viva no universo dos mangás, um dos jurados do evento, Go Nagai (Cutey Honey, Devil Man, Kekko Kamen), afirmou que o Brasil esteve muito bem representado pelos irmãos Somenzari . "Eles fizeram uma boa apresentação no palco, o que impressionou a todos nós", detalhou ele. Nagai também gostou da dupla chinesa Ni Jiating e Yu Xinhao, que fez seu cosplay com base no game Final Fantasy 7 - Advent Children.

Com a conquista do título de Campeão Mundial do WCS, fica definitivamente consolidado o nome do Brasil no universo cosplay internacional. Com concursos que apresentam cosplayers e atuações cada vez mais elaboradas, todos torcemos para que, no próximo ano, a etapa brasileira do WCS (que será novamente promovida pela Editora JBC) envie à final mundial no Japão mais uma dupla que — quem sabe? — consiga repetir o feito (até então inédito) dos irmãos Maurício e Mônica.


SAIBA MAIS
Navegue pelo universo em que atua a Editora JBC (Japan-Brazil Communication)
www.editorajbc.com.br

02 agosto 2006

MINHA VIDA

Reminiscências de um brasileiro


Nasci em 1956, cinqüenta anos atrás. O Brasil (1) estava em estado de sítio e, pra piorar, nasci corintiano: levei mais de 20 anos pra ver meu time ganhar um título. Em 1959, os militares tentam derrubar JK. Em 1961, Jânio toma um porre e renuncia. Em 1962, a crise dos mísseis em Cuba quase descamba numa guerra nuclear.

Em 1964, o golpe militar, a revolução, que impõe ao País duas décadas de ditadura. Em 1968 vem o AI-5, o ato institucional que acaba de vez com os direitos individuais. Em 1969 tivemos o auge da guerrilha urbana, assustando a todos com os roubos, seqüestros e assassinatos. Em 1972 tem início a guerrilha do Araguaia, que acontece longe de nossos olhos. Mas acontece.

Em 1973 vem a crise do petróleo, que muda de vez a história da humanidade. Em 1975 Vladimir Herzog morre, torturado nos porões da repressão. E o regime militar começa a balançar. Em 1977 o presidente Geisel fecha o Congresso. Quem é que se lembra disso? Em 1978 acontecem as greves do ABC, com os metalúrgicos se mobilizando. Surge o Lula.

Em 1981 a bomba do Riocentro gera um escândalo que prenuncia o fim do regime militar. Em 1984 o povo vai às ruas pelas Diretas Já, que não são aprovadas pelo Congresso. Em 1985, finalmente a volta, ainda meia-boca, da democracia. Tancredo Neves é eleito presidente e morre... Entre 1980 e 1994 vivemos uma superinflação crônica, uma moratória externa, um confisco monetário, duas recessões, dois colapsos cambiais, cinco planos econômicos, seis moedas e uma quase moeda. O Brasil teve 11 ministros da Economia e 14 presidentes do Banco Central!

E tivemos também o Plano Cruzado. As eleições diretas. O Plano Collor e aquela tungada em nosso dinheiro. Tivemos o impeachment, o plano Real, as crises asiática e russa. O apagão. A eleição de Lula. O mensalão... Muito prazer, esta é a história de minha vida, que completou cinqüenta anos no domingo, 25 de junho. E olhando para a minha história, pergunto-me como será viver num país sem crise... Não sei.

Desde que nasci, vivo de crise em crise. Nunca vi o Brasil com paz de espírito. Sempre enrolado, atrapalhado, desorientado, enganado, roubado, ameaçado... cara, como é difícil ser um brasileiro com 50 anos! Fui falar com meu pai, pra perguntar como era antes... E ele veio com as histórias da guerra...

Muito bem. Estou "de aniversário", como dizem os gaúchos. E estou feliz. Chego aos cinqüenta melhor que meu pai, melhor que meu avô, com uma aparência mais jovem, mais viajado, mais estudado. E meus filhos, que estão melhores do que eu estava na idade deles, provavelmente estarão melhores do que estou hoje, quando chegarem aos cinqüenta. Sou um privilegiado.

Tem gente que acha que sou “sortudo”. Sou, sim... Isso me lembra a frase de Thomas Jefferson: "Creio bastante na sorte. E tenho constatado que, quanto mais eu trabalho, mais sorte tenho"... Então é isso.

Naquele domingo, abri um vinho e brindei aos meus 50 anos. E enquanto sorvia um gole saboroso, meu pensamento esteve concentrado numa questão intrigante: como estaria eu... Aliás, como estaríamos nós, se nos últimos 50 anos o Brasil não estivesse permanentemente em crise?


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(1) O Brasil é o maior país da América Latina, seu território abrange aproximadamente metade (47.3%) da América do Sul, ocupando uma área total de 8.511.965 Km². É o quinto maior país do mundo, depois da Rússia, Canadá, China e Estados Unidos. O Brasil possui fronteiras com todos os países da América do Sul, com exceção do Chile e do Equador. Aqui, assume uma dimensão crítica que inspira o colunista

01 agosto 2006

CRÔNICA DA RAZÃO (?!?)

A gota d'água


Razão. Você a evoca, angustiada. E a razão surge, gritando em cada sinal vermelho: pare de ser louca! Mas aí o sinal esverdeia e você precisa seguir em frente, entre os automóveis e a chuva que não cessa. Ainda bem. Não fosse o sinal verde, talvez agora você ainda estivesse ali, pensativa, o carro parado no cruzamento. O cruzamento da ruazinha da razão com a imensa avenida da loucura... e do desejo.

As pessoas na rua correm para se proteger da chuva, todas certas de seu caminho, seguem rápidas e decididas. Você não. Tudo em seu ser se contradiz, uma célula quer ir, outra morre de medo. Sim e não. Em seu peito o coração bate no compasso da urgência, em suas veias o sangue se desencontra. Não e sim. No rádio, música nenhuma entende o seu estado de ânimo. E essa chuva, a deixar tudo ainda mais confuso... Sim e não. Ai, que vontade imensa de gritar... Você respira fundo. E acelera.

Francamente falando, você sabe muito bem que limites existem para serem quebrados, não é? E os seus há muito que a desafiam: sim. Para ser exato, desde que ele surgiu, de repente, não mais que de repente. Ele e seu olhar inquietante, o jeito diferente... Você já não sabe se ele é louco ou se louca fica você toda vez que o vê. Tem algo nele que dá um arrepio, um calor, não é? Você nunca sentiu antes, não sabe explicar. Não. É algo meio insano, que a faz inventar uma mentira e largar o trabalho no meio da tarde. É algo que a fez soltar o cabelo, deixar o soutien na bolsa e sair no meio dessa chuva louca... Ai, essa chuva... Sua vida antes era tão certa e agora tudo é tão... imprevisível. Mas ao mesmo tempo você tem raiva dele, por invadir assim seu espaço, ele não tinha o direito. Não. Sim, ele tinha virado seus dias de cabeça para baixo. Ah, mas você tem que admitir: ver o mundo desse novo ângulo é muito interessante...

Ahnn... mas... e a ética, como fica? Afinal, você tem namorado. E você o ama. Bem, na verdade talvez não o ame como achava que amava. Sim, pois se amasse, não desejaria esse homem assim. Ou não? Ou o amor nada tem a ver com o desejo? Se os homens são capazes, por que você não seria também? Uma mulher pode entregar-se a um homem, uma vez só, e voltar para outro, como se nada tivesse acontecido? Como uma chuva que de repente já passou? "Sim, pode", você mesma responde, surpresa com a própria determinação. Pode voltar sim, mas não como se nada houvesse acontecido, pois sempre terá acontecido, "sempre...?", você completa, olhando seu sorriso diferente no retrovisor.

Você lembra da última briga, um dia antes, e então, sem perceber... seu pé pisa mais fundo no acelerador. E a chuva aumenta, seguindo sua determinação. Sim. Não, não se trata de vingança, nada disso. É só a velocidade do desejo. Não. Na verdade é mais que isso. É uma necessidade. Você tem de encontrá-lo. Sim. Você precisa. É a única coisa que importa agora. Em frente ao prédio, dentro do carro, você inventa mil coisas para se dar mais um tempo para pensar. Olha a chuva, olha de novo. Então finalmente pega o celular. E liga. Deixa chamar uma vez e desliga. Agora só tem que aguardar alguns segundos. Mas não são alguns segundos — é um século!

Um século inteiro de dúvida e angústia, onde razão e desejo vêm se chocar em sua alma feito as gotas da chuva que batem no vidro, uma gota sussurrando "sim" e a outra gota gritando "não", "sim" e "não", "não" e "sim"... Lógico que não! De súbito, você dá-se conta do absurdo. Claro que não. O que está fazendo? Esperando por um homem que mal conhece? Para quê? O que lhe dirá? Que largou o trabalho no meio dessa tempestade só para desejar-lhe "boa-tarde"? O que ele vai pensar? Vai pensar que é louca, claro.

De repente, tudo fica límpido como um dia de sol. Não, não vale a pena se arriscar tanto por algo que não tem chance de dar certo, não, alguém que você não sabe quem realmente é, alguém que semana que vem irá embora, alguém que... A porta se abre, porém. E ele entra. E senta-se no banco ao seu lado. Todo molhado, rindo, parece um menino travesso. Você se vira, assustada, e dá de cara com aqueles olhos, aquele sorriso... Meu Deus, você pensa, me ajude, por favor, me ajude... Mas seu deus não pode ajudar, não com essa chuva toda. Não.

Ele então se aproxima, estende a mão e delicadamente toca seu rosto. Não... Não é mais um menino travesso, é um homem. Não? Então tudo que não podia acontecer, acontece: uma gota dágua escorre... da mão dele... para dentro... do seu decote. Você a sente deslizar... pelo contorno do seio... cada microscópico pelinho acusando a passagem... Enquanto a gota prossegue em seu íntimo percurso, você fecha os olhos, sente um arrepio na alma inteira. Você quer morrer, só para não ter que decidir.

Você se controla para não gritar, para não abrir a porta e sair correndo na tempestade, você quase explodindo, esticada entre o sim e o não... Não. Não, você não grita. Nem poderia. Porque os lábios dele, molhados da chuva, tocam os seus e o grito morre em sua boca. E da vida previsível faz-se a aventura. Não mais que de repente.


SERVIÇO
O colunista Ricardo Kelmer é escritor, letrista e roteirista e mora no Rio de Janeiro, Terra (a 3.ª pedra do Sol)...

LEIA COM IMAGENS E COMENTÁRIOS
www.ricardokelmer.net/rktxtagotadagua.htm

O QUE MÁRIO APRENDEU NO SUL

Definições definitivas


O "passarinho" Mário Quintana faria 100 anos neste finzim de julho: o tempo passa — e, com ele, até os poetas passam. Só a visão que Mário tinha das coisas é que nos parece, digamos, definitiva. Após construir sua vasta produção literária, aos 87 anos ele teria então dito:

"A morte é quando a gente pode, afinal, estar deitado de sapatos."

Mário sabia ser amargo quando queria, não é? Levando em conta o quanto tudo pode ser menos rançoso — se assim o quisermos! —, vamos seguir o fluxo antidiscriminatório do pensamento deste poeta profundo, nascido em Alegrete e partido em Porto Alegre (adaptam-se a palavra que o poeta traz no peito e a que esgrime?):


"Deficiente" é aquele(a) que não consegue modificar sua vida, aceitando as imposições de outras pessoas ou da sociedade em que vive, sem ter consciência de que é o(a) únic(a) dono(a) do seu destino...

"Louco(a)" é quem não procura ser feliz com o que possui...

"Cego(a)" é aquele(a) que não vê seu próximo morrer de frio, de fome, de miséria. E só tem olhos para seus míseros problemas e pequenas dores...

"Surdo(a)" é aquele(a) que não tem tempo de ouvir um desabafo de um amigo, ou o apelo de um irmão. Pois está sempre apressado para o trabalho e só pensa e quer garantir seus tostões no fim do mês...

"Mudo(a)" é aquele(a) que não consegue falar o que sente e se esconde por trás da máscara da hipocrisia...

"Paralítico(a)" é quem não consegue andar na direção daqueles que precisam de sua ajuda...

"Diabético(a)" é quem não consegue ser doce...

"Anã(o)" é quem não sabe deixar o amor crescer...

E, finalmente, a pior de todas deficiências é mesmo a de ser miserável, pois "Miseráveis" são todo(a)s o(a)s que não conseguem falar com Deus!


SAIBA MAIS SOBRE O POETA MÁRIO QUINTANA
www.opovo.com.br/opovo/vidaearte/616835.html

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Troque uma idéia com a Letícia das Graças, que nos enviou este texto
http://www.orkut.com/Profile.aspx?uid=17060428479751581249