29 dezembro 2017

"AGRO É - NEGÓCIO!"

Ideia falsa tá na Grobo


A propaganda é a alma de qualquer negócio, dizem. O que achar, então, da ofensiva publicitária maciça e bem produzida do setor agroindustrial – “tá na Globo!” – com que estamos sendo bombardeados há meses, de modo ininterrupto? O mero volume e variedade das peças exibidas já podem causar arrepios.

Não pelo que é mostrado, claro. Aí tudo é lindo e fascinante. Mas pelo não dito, pelo deliberadamente omitido ou ocultado. Um determinado modo de compreender a função da agricultura, o destino dos recursos naturais, o emprego da força humana e dos meios tecnológicos – um modo, no mínimo, complexo e ambivalente – é apresentado como verdadeira panaceia para o País. Aqui cabem considerações críticas.

"Agro" é "tech" – de “technology”. A opção propagandística por abreviações (do inglês) gera, certamente, a impressão de modernismo, inclusão global e jovialidade – mas, ao mesmo tempo, indica que algo permanece não dito. Quem diz “agro”, se envergonha do nome todo: "agronegócio". Por quê?

Porque recordaria a razão última de qualquer empreendimento capitalista: auferir lucro privado. Mas, voltemos ao"tech": poderia ainda derivar de “technocracy”, um modo de produção em que a lógica técnica comanda. De certo, não faz sentido – a partir de uma visão romântica da lavoura arcaica – lutar contra o emprego racional de meios técnicos para facilitar a labuta humana.

Mas não é honesto negar a contradição inerente ao processo de racionalização tecnológica: a de, ao mesmo tempo, eliminar o trabalho humano, tornado obsoleto. Onde a lógica vigente é a de custo/benefício para o investidor, a decisão sobre o que será plantado, mecanização da lavoura e uso de agrotóxicos obedece a um cálculo frio de rentabilidade, não a preocupações humanitárias.

E o produtor rural que recorre à mão de obra semiescrava? Não tá na Globo.

"Agro" é "pop" – de “popular”? Sério?! Antes, parece um esforço descomunal para enfiar o conceito goela abaixo, repetindo-o ad nauseam e associando-lhe belas imagens e efeitos sonoros.

E o que dizer de: "Agro é tudo?" Lançando mão de conteúdos educativos que provam, de fato, a onipresença de processos químicos, a campanha publicitária passa a ideia falsa de o agronegócio ser responsável por tudo de valor que se produz na natureza. Presunção deveras totalitária! Xô!

O princípio da subordinação da propriedade privada ao destino universal dos bens [...] é o primeiro princípio de toda a ordem ético-social” (João Paulo II, 1981). Falou tudo, cara!

Carlo Tursi é professor e teólogo. 



06 setembro 2017

DOIS MIL E DEZESSETE

Cá estamos!

Em breve, traremos um novo encaminhamento ao material postado neste blog.

Pretendemos focar em apenas uma área da cultura. Apenas uma arte.

Assim, vamos resenhar algumas impressões pessoais, de forma a dar cor a opiniões e sugestões.

De todo modo, haverá sempre um mercado à espreita.

Que o mesmo se localize aqui, entre a água e a areia, e que vc, que desfruta e aprende com nossas postagens, curta-as ainda mais.

Consequentemente, adeus olhares genéricos sobre temáticas atuais e polêmicas populares.

E bem-vindos (assim mesmo, revisor!) aos insights acerca do que realmente vale (?) compartilhar.


(a) O Editor

09 fevereiro 2017

ORDENANDO O SENTIDO


Adivinhar é preciso*



Confiar no Facebook não é uma rima, tampouco uma solução. Mas, por incrível que pareça, tem funcionado. Se não para o longo prazo, ao menos para o dia seguinte. Quando Mark Zuckerberg diz que vai chover e sugere que tenha cuidado para não me molhar, chove e me molho. 

Como ontem. Fazia sol quando acordei. Desci para comprar frutas. Na volta, tomei chuva. Cheguei encharcado em casa. Ou antes de ontem, quando desisti de sair porque, contrariando o que dizia o FB, achei que choveria. Fez sol, e perdi um dia de passeio na praia.

Como quase tudo, a previsão climática é uma atividade inexata. Diz-se ciência para melhor passar, como os livros de autoficção que se fingem de vida real para atenuar tudo que carregam de invenção e turbinar suas vendas. Entretanto, dependemos dela, dessa casualidade. 

Calculamos nossas chances de sucesso ou fracasso a partir de seus prognósticos. Confiamos em seus algoritmos. Apostamos as fichas nessa roleta randômica. E perdemos. Ou ganhamos. Chove. Faz sol.

Cotejam-se variáveis e, dentro de um conjunto já suficientemente heterogêneo, outras variáveis, como uma matrioska. De modo que, se qualquer uma dessas pequenas peças muda de lugar, todo o quadro se altera. Daí a confusão. 

Vale pras nuvens e pra chuva. Vale pra vida também. Quando um tijolo sai do canto, o muro se desloca. Mesmo a imobilidade se transmuta. As dunas não se contentam com a quietude. Passeiam, e, nessa passagem, se desfazem. Remontam-se novas noutra geografia.

Para além de todo esse lugar-comum, porém, há algo nas previsões que se aproxima da poesia: nada é suficientemente claro até que aconteça. Nada prepara para a mudança, sobretudo a que não se anuncia. 

Uma hora, a gente olha pra trás e o que vê já é passado. Não o passado morto e enterrado. Mas um passado vivo, que nos interroga de volta e sentencia: impossível qualquer retorno. Para quem tenta a fuga, o passado é a pior escolha.

Então viajamos sempre para frente, nunca para trás. Fazemos isso amparados em previsões cujas bases movediças não disfarçam o seu caráter de truque. Não falo do trabalho respeitoso que é perscrutar o comportamento dos mares e ventos e depois anunciar se vai chover ou fazer sol. 

Me refiro à adivinhação da vida nova nas pequenezas do cotidiano. Mais ou menos como os profetas da chuva quando pelejam com o exercício da antecipação. Quando futuram, são mais poetas que profetas.

O que fazem? Leem a natureza. Plantas, animais, sombras. Interpretam os rastros do orgânico no que cerca. Veem sinais onde antes havia apenas o pouso da ave. São ordenadores de sentido. 

E, ainda que não decifrem letras e números, enxergam tudo como um grande texto, que inclui o quintal, a casa, o amor, o mundo. Praticam uma ciência imprecisa de trazer para perto de si o que é possível. Namoram a hipótese, mas com pé no chão.

É bonito o trabalho de um profeta da chuva. É bonita toda sorte de malabarismo que fazemos – com palavras e gestos – para habitarmos um tempo que ainda não chegou. Melhor ainda é quando esse tempo chega. 

Porque, correspondendo ou não ao que um dia foi previsão, tem uma qualidade que nenhum outro tempo tem: é presente. Goste-se ou não, está aqui. É agora. Se chover, tomaremos chuva. Se fizer sol, faremos um passeio.




*Henrique Araújo é jornalista.

(conteúdo publicado em www.opovo.com.br)
(imagem em www.pexels.com)

25 janeiro 2017

TALENTO AUTODIDATA


Cartunista cearense recebe Prêmio Angelo Agostini como “Melhor de 2016



    Em ação na redação do jornal O Povo em Fortaleza

O cartunista Carlos Henrique Santos da Costa, que assina sua produção como “Guabiras”, foi indicado pelo voto popular ao 33.º prêmio Ângelo Agostini, promovido pela AQC-Associação dos Quadrinhistas e Cartunistas do Estado de São Paulo, como “Melhor cartunista de 2016”.

Ele deve ir ao auditório do Memorial da América Latina na capital paulista neste dia 28, representando o jornal O Povo do Ceará -- onde trabalha como ilustrador há quase 20 anos --, para a cerimônia de entrega do prêmio, que nesta edição destaca o quadrinhista de origem argentina Rodolfo Zalla, falecido em junho passado.

Zalla fundou em São Paulo, com o também quadrinhista Eugenio Colonnese, a editora D-Arte, lançando vários artistas e títulos do gênero “terror nacional” no mercado local, entre 1967 e o início dos anos 1990.

Guabiras, que na categoria “Criação Gráfica” recebeu um Prêmio Esso em 2015 e tem se destacado por suas charges e cartuns, publicados em seu blog independente e em periódicos como a versão brasileira da revista Mad e o jornal norte-americano Extra, festejou a homenagem recebida como “um evento muito importante para a minha carreira”.

O pioneiro quadrinhista Angelo Agostini, que no Brasil de 1869 lançou "As Aventuras de Nhô Quim ou Impressões de Uma Viagem à Corte", dá nome ao prêmio que, desde 1984, presta reconhecimento aos profissionais da área, visando “o resgate e a referência aos grandes artistas do quadrinho nacional”.

Segue a lista dos premiados:

Melhor Desenhista – Mary Cagnin
Melhor Roteirista – Alex Mir
Melhor Cartunista – Carlos Henrique Guabiras
Melhor Lançamento – “Spectrus – Paralisia do Sono”, de Thiago Spyked
Melhor Lançamento Independente – “Protocolo: A Ordem” (Diversos autores)
Melhor Web Quadrinho – “Marco e Seus Amigos”, de Tako X Melhor Fanzine – “Café Ilustrado”
Prêmio Jayme Cortez – Ivan Freitas da Costa (Chiaroscuro Studios)
Mestres do Quadrinho Nacional – Arthur Garcia, Gualberto Costa, Sérgio Graciano (MSP) e Sidney L. Salustre (MSP)


20 janeiro 2017

MARAVILHOSA "PEACH PALM"


Pupunheiras estão entre as primeiras plantas domesticadas pelos indígenas
(conteúdo publicado por Evaldo Ferreira:
19.01.17, em http://portalamazonia.com)
 Foto: Divulgação
A pupunha é um poderoso antioxidante, devido aos carotenoides e selênio que há em sua composição



Todo início de ano é a mesma coisa. Como um presente dos deuses da floresta, o mercado Adolpho Lisboa, a feira da Manaus Moderna, as demais feiras e os vendedores das esquinas enchem a cidade de belos cachos de pupunha (Bactris gasipaes), com seus frutos verdes, amarelos ou vermelhos. Quem resiste a pupunhas cozidas no café da manhã? E a tradição vai longe, mesmo que a princípio seu uso primeiro fosse a extração da madeira. 

Segundo pesquisas realizadas por Margaret Cymerys e Charles Clement do Instituto de Pesquisas da Amazônia (Inpa), indicam que as pupunheiras estão entre as primeiras plantas domesticadas pelos indígenas, há milhares de anos, mas seu uso como alimento é muito tardio.

Eles não sabiam o que estavam perdendo. Aliás, o palmito da pupunha, rico em nutrientes e vitaminas, atualmente é bastante requisitado por chefs de restaurantes renomados do Sul do país. Em comparação a outros palmitos, o da pupunha tem a vantagem comercial de se formar mais rapidamente. Já o fruto é um poderoso antioxidante, devido aos carotenoides e selênio que possui em sua composição, o que auxilia no combate o envelhecimento da pele. 

A pupunha pode ainda ser utilizada na fabricação de pães, bolos e muito mais, conta a nutricionista do Inpa, Dionísia Nagahama. "São preparações culinárias saudáveis com alimentos encontrados na região, de baixo custo, utilizando as partes geralmente desprezadas desses alimentos, como talos, cascas e sementes", explicou Dionísia que pesquisa a culinária a partir das pancs (plantas alimentícias não convencionais), como o tucupi de cubiu. No caso da pupunha, ela usa a polpa. E ainda tem o óleo, que corresponde de 2% a 30% do fruto, e pode substituir o azeite de oliva. 

Rica em nutrientes
As cores amarelas, laranjas e vermelhas da pupunha são resultado do caroteno (70 ml por cada 100 gramas de polpa), explicou Margaret Cymerys. "Quanto mais vermelha a polpa, mais vitamina A ela possui, contribuindo para a saúde dos olhos, cabelos, unhas e pele. A polpa de pupunha também oferece cálcio, ferro e fósforo", escreveu Margaret. Outro estudo, sob a coordenação de Helyde Marinho, também do Inpa, pesquisa quatro produtos à base dos óleos da pupunha e do buriti: sabonetes líquido e sólido, emulsão evanescente e creme antioxidante. Todos patenteados e prontos para serem industrializados.

500 cachos/dia
A família de Mel Gbson Dantas (que não é o ator australiano), trabalha há mais de 15 anos na Manaus Moderna. "Quando inicia dezembro começam a chegar os cachos de pupunha, vindos de Coari, onde temos um sítio. Até março as remessas diárias não param" disse o comerciante da feira da Banana. No sítio a família produz açaí, macaxeira, mandioca, guaraná, abacaxi e pupunha, tudo vendido a seu tempo na feira, em Manaus. 

Por dia, a banca, onde trabalham Gelcineide Dantas, tia de Mel, e mais quatro ajudantes, recebe 400 cachos de pupunha. "Mas vendemos cerca de 500 cachos. Esses 100 a mais, compramos de outros produtores que trazem a fruta do distrito de Caviana (na BR 174), de Fonte Boa e até de Boa Vista (RR). Não é porque é nossa, não, mas a pupunha de nosso sítio é melhor que as outras, pois dura mais e chega aqui fresquinha", garantiu.

As embarcações saem de Coari, do sítio dos Dantas, diariamente, e levam um dia para chegar a Manaus. "Para baratear o frete, as pupunhas vêm em pencas com três cachos e pagamos R$ 1, pela penca. Se viessem os cachos separados, pagaríamos R$ 1 por cacho", disse. Na banca da família os cachos custam de R$ 5, a R$ 35, "dependendo da aparência dos frutos", revelou o feirante. 

De 5 a 26 cachos
A pupunheira alcança 25 metros de altura e cada tronco atinge de 10 a 25 cm de diâmetro. A planta forma uma touceira com até 15 troncos espinhosos. Há muitas variações na cor da casca do fruto (verde, vermelha, amarela, laranja), no teor de óleo (de 2% a 30% do peso fresco) e no tamanho do fruto (de 10 a 200 gramas). Além disso, existem frutos sem sementes.

A pupunheira floresce entre agosto e outubro e frutifica entre dezembro e março, raramente até abril. Porém, existem indivíduos que reproduzem fora dessa safra, especialmente em anos de chuvas abundantes e em solos mais ricos em nutrientes. Quando está com flores, a pupunheira é visitada por milhares de gorgulhos e outros besouros polinizadores.

Cada pupunheira produz de cinco a dez cachos por ano. No entanto, há palmeiras que chegam a produzir 25 cachos em apenas um ano chuvoso, em solo bom. Cada cacho de pupunha pesa entre dois e doze quilos e contém aproximadamente 100 frutos, podendo atingir até 400 frutos por cacho. 

Uma pupunheira pode produzir de 10 a 120 quilos de frutos. A colheita de um hectare pode variar de quatro a dez toneladas por ano. Às vezes, ocorre baixa produção por causa da polinização insuficiente, falta de chuva, falta de matéria orgânica ou solos compactados.

Festa da Pupunha 
As tribos indígenas do alto dos rios Solimões e Negro, no Amazonas, fazem uma festa durante a safra da pupunha. A festa é regada por caissuma e por comidas feitas com os frutos cozidos e farinha. Caissuma é uma bebida fermentada de pupunha e tem aroma de pêssego maduro. Por isso o geógrafo, naturalista e explorador nascido na Prússia (atual Alemanha) Alexander Von Humboldt criou, em sua passagem pelo Amazonas no século 19, os nomes europeus para a pupunha: "palmeira de pêssego" (Portugal), "palmera de melacotón" (Espanha) e "peach palm" (Inglaterra).

Palmito de pupunha 
As vantagens do palmito da pupunheira em relação às outras espécies do seu gênero é o pouco tempo para a formação do palmito, o seu sistema de perfilhamento e as qualidades químicas do próprio palmito. Ao cortar o primeiro palmito da palmeira (mãe), depois de 12 a 18 meses no campo, o perfilho já está bem crescido e dará seu palmito em mais 6 a 9 meses.

Bons para a saúde
Em Manaus, os frutos são frequentemente consumidos depois de cozidos em água e sal e têm várias qualidades. Valor nutricional: são uma excelente fonte de fibra alimentar, proteína e alguns minerais, tais como ferro, zinco, cobre, manganês, magnésio, cálcio, fósforo e potássio. 

Benefício na prevenção de doenças degenerativas: as cores vivas do fruto não são à toa: os tons que variam do amarelo para o vermelho indicam alta concentração de carotenoides, substâncias ricas em antioxidantes e que estão associadas à prevenção de doenças degenerativas.

Benefício para a pele: para quem deseja combater o envelhecimento precoce, um dos principais benefícios do fruto é sua grande quantidade de antioxidantes. Além de deixar a pele mais firme, beneficia a visão, o sistema imunológico e os ossos, que são fortalecidos.

Benefício para a digestão: o palmito da pupunha é um alimento pobre em gorduras e rico em fibras.