29 julho 2013

TECNOLOGIA SEM CONSENSO


Transgênicos:
está tudo legal?



Plantação de soja em Não-Me-Toque,
nordeste do Estado do Rio Grande do Sul

Os organismos geneticamente modificados avançam a passo firme no Brasil, país onde convivem as variedades das corporações globais e os desenvolvimentos da ciência nacional.

 Há dez anos o Brasil legalizou cultivos de soja transgênica, cedendo à pressão da agroindústria. Hoje é o segundo maior produtor de organismos vegetais geneticamente modificados, atrás dos Estados Unidos. Os transgênicos eram cultivados clandestinamente no Brasil desde a segunda metade da década de 1990.

O ano de 2003 representou um marco, com o decreto 4.680 que regulamentou a rotulagem de alimentos que contivessem pelo menos 1% de organismos transgênicos. E, sobretudo, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011) deu um passo definitivo ao autorizar com sucessivas medidas provisórias o cultivo de soja modificada, diante do fato consumado de plantações ilegais no sul do país com sementes contrabandeadas da Argentina.

Em 2005, a Lei de Biossegurança estabeleceu o contexto normativo definitivo, ao criar a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, encarregada de estudar, aprovar e recusar os pedidos de plantio e comercialização de transgênicos. Dois anos depois, outra lei criou o Comitê Nacional de Biotecnologia, para coordenar e implantar uma política geral de desenvolvimento biotecnológico.

Pragas, problemas fitossanitários e espécies invasoras são as principais razões das perdas financeiras na agricultura, sobretudo pela dificuldade de monitorá-las e controlá-las, segundo o engenheiro agrônomo João Sebastião Araújo, do Instituto de Agronomia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

“Neste contexto, em 1996 teve início uma nova tecnologia, a transgênese, com uma variedade de milho que continha a expressão proteica da bactéria Bacillus thuringiensis (Bt)”, de propriedades inseticidas, explicou Araújo. “Se converteu em uma das tecnologias mais empregadas na agricultura norte-americana, e alcançou rapidamente a maior porcentagem das plantações de milho no país”, acrescentou.

A partir desta tecnologia, ocorre uma nova intensificação no uso de fertilizantes, novas variedades, máquinas agrícolas e introdução de moléculas de agrotóxicos. “Tudo destinado a obter maiores rendimentos”, resumiu Araújo. Este novo pacote tecnológico passou a ser difundido pelas corporações transnacionais em países como o Brasil, que configura “um mercado excepcional” por suas áreas de plantação de soja, milho e algodão, ressaltou o agrônomo. Nestas condições, ocorreram as pressões empresariais para que as autoridades liberassem o uso da transgênese, com a promessa de eficiência e baixo custo.

Segundo a consultoria Céleres, especializada em informação para o agronegócio, os transgênicos ocupam 37,1 milhões de hectares no ano agrícola 2012-2013, o que implica crescimento de 14% (4,6 milhões de hectares) em relação à safra anterior. A soja lidera, com 24,4 milhões de hectares plantados em 2012, ou 88,8% do total desse cultivo.

A colheita de inverno de milho mostra que os transgênicos ocupam 87,8% (6,9 milhões de hectares) das plantações. E no milho de verão as variedades modificadas cobrem 64,8% das superfícies plantadas, equivalentes a 5,3 milhões de hectares. Por sua vez, o algodão geneticamente modificado constitui pouco mais de 50% (547 mil hectares) do total previsto para a safra 2012-2013, segundo a consultoria.

Araújo afirmou que o Brasil é muito competente em pesquisas agrícolas e seus cientistas conseguem “resultados excepcionais”, contribuindo para implantar semeaduras e rendimentos não imagináveis no passado. Contudo, sem negar o avanço tecnológico, ainda não há respostas suficientes para uma série de alertas sobre os transgênicos, advertiu. 

“Deve-se ter cautela para não usar esta tecnologia sem o necessário critério. Hoje, a Europa está convencida de que seus impactos vão muito longe. Estamos falando de uma técnica muito recente. No Brasil existe apenas há dez anos, na Europa 13 e nos Estados Unidos 17”, ressaltou.

O presidente da estatal Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa), Maurício Lopes, destaca outro aspecto. Os trópicos são a região do planeta mais desafiadora para a agricultura, devido às manifestações das mudanças climáticas e à necessidade de reduzir a emissão de gases-estufa gerados por essa atividade humana, afirmou.

“Devemos lançar mão de todo o arsenal tecnológico que dispomos. Cremos que são importantes a moderna biotecnologia, a nanotecnologia, as novas ciências e os novos modelos. O Brasil não pode dizer não a essas técnicas, porque os desafios atuais são enormes”, disse Lopes. 

Para ele, o balanço destes dez anos é positivo, mas há a necessidade de um uso inteligente, planejado e cuidadoso destas novas ferramentas. “Somos favoráveis à transgênese. Entendemos que há uma estrutura de métodos e procedimentos para empregá-la de forma segura”, acrescentou Lopes. Mas, sobretudo, critica o fato de a biotecnologia permanecer sob controle de uns poucos atores globais, como as corporações agroalimentares.

A Embrapa agora aposta no desenvolvimento de novas variedades de feijão, tomate e papaia. “Estamos testando um feijão transgênico resistente a uma doença terrível, o vírus do mosaico dourado, transmitido por um inseto. Este produto já foi desenvolvido pela Embrapa e agora está na fase de testes”, detalhou Lopes. A próxima fronteira são as hortaliças. Os cientistas brasileiros já obtiveram alface modificada contendo grandes concentrações de ácido fólico.

“O ácido fólico é um componente fundamental na dieta das mulheres grávidas, por sua importância na formação do sistema nervoso do feto. Estamos testando e deve passar por uma longa bateria de avaliações. No entanto, é um produto que, talvez no futuro, esteja em nossa mesa”, previu Lopes.

Enquanto os defensores dos transgênicos alegam que estes podem ser uma ferramenta para abater a fome e o uso de herbicidas, pesticidas, fungicidas e microfertilizantes, os ecologistas apontam os riscos que têm para a biodiversidade agrícola. A organização Greenpeace insiste em afirmar que sua liberação na natureza pode causar a perda de plantas e sementes que constituem um patrimônio genético da humanidade.

“Defendemos o modelo de agricultura baseado na biodiversidade agrícola e que não empregue produtos tóxicos, por entendermos que só assim teremos agricultura para sempre”, afirmou o Greenpeace em um comunicado. Além disso, a organização destacou que não existe consenso na comunidade científica sobre a segurança dos transgênicos para a saúde humana e o meio ambiente. 


(Fabíola Ortiz em http://envolverde.com.br)
(foto: Nilson Konrad / Inter Press Service)


25 julho 2013

CIÊNCIA & TECNOLOGIA



Região amazônica
terá plano, diz Raupp





O governo federal prepara um Plano de Ciência e Tecnologia para a região amazônica. Prevista para ser lançada em setembro, a medida foi anunciada pelo ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Marco Antonio Raupp, durante a 65.ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

“A proposta é um plano de desenvolvimento sustentável da região amazônica com a utilização de seus recursos naturais. [O plano é construído] com a participação de instituições de ciência e tecnologia da região, governos estaduais e federal”, descreveu Raupp.

Segundo o presidente do Centro de Gestão de Estudos Estratégicos (CGEE), órgão ligado ao MCTI e responsável pela coordenação do plano, Mariano Laplane, a proposta foi elaborada de forma colaborativa, com estrito enfoque nas necessidades locais. “O plano é arrojado, e parte de uma pergunta básica: como é que ciência, tecnologia e a inovação devem se estruturar, orientar seus esforços para promover o desenvolvimento da região amazônica?”.

A iniciativa é baseada em três eixos: perfis de pesquisadores mais adequados para o trabalho na região, infraestrutura de laboratórios e ambientes de inovação. “Procuramos respostas em três questões fundamentais, como a necessidade de recursos humanos, qual a quantidade e o perfil que a ciência brasileira deve mobilizar na região. Quais as áreas de conhecimento devemos concentrar nossos esforços para alavancar o desenvolvimento sustentável e quais são os recursos laboratoriais, a infraesturura, que junto com o esforço humano vai conseguir fazer com que o conhecimento avance”, aponta Laplane.

O presidente do CGEE explica que o ministério ainda está definindo os recursos que serão aplicados e quantos pesquisadores serão contratados para implementação da iniciativa. Outro plano voltado para a Região Nordeste já começou a ser construído, com a mesma filosofia adotada para a região amazônica, mas ainda não tem previsão para ser lançado.
  
“A região [amazônica] tem uma vocação muito forte com sua biodiversidade. O que falta é um instrumento de desenvolvimento pensando na sustentabilidade. Temos que fugir do pensamento que é preciso destruir a natureza para conseguir riqueza e o contrário também não é verdadeiro. Não é suficiente gerar conhecimento, ele deve chegar à sociedade, à população, às empresas para se transformar em riqueza, gerar bem-estar”, concluiu Lapane.

Em outro anúncio, o ministro Marco Antonio Raupp divulgou a aquisição do navio de pesquisas hidroceanográficas para ampliar a presença da ciência nacional no Atlântico Sul e Tropical. 

A embarcação faz parte do projeto do Instituto Nacional de Pesquisas Oceanográficas e Hidroviárias (INPOH), que prevê uma série de ações em áreas como a conservação da biodiversidade marinha, a melhoria de processos associados à pesca, proteção e adaptação de zonas costeiras para as mudanças climáticas, realização de estudos sobre vias fluviais, hidráulica fluvial e portuária, além de formação de recursos humanos para o setor.

De acordo com o ministério, a compra, no valor de R$ 162 milhões, é resultado de um acordo de cooperação entre a pasta, a Marinha, Petrobras e a empresa Vale. O navio terá capacidade para 146 tripulantes, dos quais 60 pesquisadores, e contribuirá para o avanço de pesquisas nas áreas de química, geologia, biologia e de física marinha.



(Heloisa Cristaldo, em http://agenciabrasil.ebc.com.br)
(edição: Carolina Pimentel)



23 julho 2013

TAPETE VERDE


Sistema "Nourishmat"
é alternativa fácil
para ter (e manter)
uma horta em casa



As esteiras usam uma técnica de metro quadrado de jardinagem que
maximiza o espaço quando comparada às tradicionais linhas de plantio

Ter uma horta em casa pode parecer uma tarefa difícil para quem tem pouco conhecimento de jardinagem, além de falta de tempo e espaço. Foi pensando nessas dificuldades que a empresa norte-americana Earth Starter criou o Nourishmat, um sistema que ensina o passo a passo de como plantar e cuidar de uma horta.






O guia de plantio consiste em uma espécie de tapete feito de polipropileno reciclável que age como barreira de plantas daninhas. Ele vem enrolado e com instruções impressas em tinta não tóxica. Para usar basta desenrolá-lo, instalá-lo onde desejar e colocar as sementes, já envoltas numa massa de adubo, nos furos indicados. Pronto! Até a rega não é necessária, uma vez que ele vem com um sistema automático de irrigação.






O Nourishmat acompanha 19 variedades de plantas, como cebolinha, hortelã, salsa, cenoura, entre outras, sob a forma de 82 bolas de sementes, a fim de se ter uma abundância de vegetais.






As esteiras usam uma técnica de metro quadrado de jardinagem, que maximiza o espaço quando comparada às tradicionais linhas de plantio. Elas estão disponíveis em dois tamanhos, 4x6 e 2x6 metros, ambos adequados para espaços pequenos e tem duração de 3 a 5 anos.






O produto ainda está em fase de produção, e aguardando investimentos através do Kickstarter, um site de financiamento coletivo que irá ajudar a centralizar as operações em um só lugar.


Segundo os criadores o tapete será vendido por aproximadamente US$ 65 (cerca de R$ 140,00) sem irrigação e US$ 80 (R$ 170,00) com irrigação - um preço que poderia colocar o produto na gama de projetos de jardinagem escola. Mas quem já quer ter um Nourishmat pode contribuir com US$ 55 ou mais para a campanha Kickstarter e receber o produto em casa.

(conteúdo publicado em www.ecodesenvolvimento.org)

16 julho 2013

O BOM EXEMPLO


Geração Peter Pan 
precisa é crescer




A geração a que me refiro, infelizmente, não é essa, atual, que rouba e mata sem noção. É a minha, aquela que, quando jovem, acreditou em muitas tolices bem-intencionadas. O Partido dos Trabalhadores, por exemplo.

Lembro-me bem do entusiasmo com que nós, artistas e intelectuais da Vila Madalena, pintávamos a nascente estrelinha vermelha em tampas metálicas de garrafa, para vendermos. Deu no que deu: a classe proletária foi ao paraíso e, uma vez lá, fez o que achava certo. A vingança do povão: roubar, se divertir, virar mais burguês que os piores burgueses. A coisa pública para eles, ex-pobres, agora ricaços, é privada. Literalmente. Cagam e andam para leis, democracia, ética, o escambau.

Outra bobagem de que nós, jovens idealistas da década de 1970 e 1980, nos arrependemos muito é o Partido Verde. Abraçamos a Lagoa Rodrigo de Freitas, no RJ, e erguemos nosso sonho libertário em torno da sunga de crochê do Fernando Gabeira. 

O resultado está aí: o Partido Verde amarelou, se tornou uma espécie de legenda de aluguel, nem o Código Florestal discutem mais. Os fundadores íntegros pularam fora a tempo, mas o PV continua na moita enquanto o desmatamento avança. O MDB só foi oposição na campanha das Diretas, depois ganhou um P e as chaves do cofre da Viúva. Os crentes andavam pacificamente com suas Bíblias, até descobrirem a força do deus-Mercado. 

Acompanhamos e lutamos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Esse mesmo, que se tornou um aval para a bandidagem mirim. Nem precisava terminar com ele, como a sociedade parece querer: basta mudar um item e lembrar que, independente da idade, sociopata perde o manto da proteção e tem de ficar fora de ação. Simples assim.

Introduzimos as noções revolucionárias de Reich, o psiquiatra maldito, no Brasil. O pessoal finalmente aceitou, mas entendeu tudo errado: orgasmo e vitalidade corporal eram para dar prazer, não para exibir em academias de malhação.

Presos políticos, alguns de nós, candidamente, passamos noções de organização para colegas presos comuns. Enquanto levávamos uma surra brava da ditadura, os coleguinhas malacas montaram as bem-sucedidas holdings do crime: PCC, A.D.A., e muitos filhotes a dominar, e lucrar, nos presídios e nas comunidades. 

As mulheres da minha geração foram feministas, sim. Lutaram e garantiram seus prazeres e o uso de seus corpos. Mas muitas exageraram e liberaram demais as filhinhas, que andam por aí exibindo gravidez precoce e amor incondicional aos funkeiros.

Está mais do que na hora da minha geração crescer, fazer seu mea culpa, ou culpa inteira, e dar a volta por cima, saindo debaixo dessa cumplicidade indecente. Os velhinhos idealistas de ontem precisam dar o bom exemplo que já tentaram dar antes.



*Ulisses Tavares, 63 anos, poeta, participou ativamente de movimentos 
de cidadania no Brasil nas últimas décadas. Ajudou a fundar partidos, 
mas nunca se filiou a nenhum deles e anda se sentindo bem sozinho 
na batalha. É autor de alguns livros, entre eles Hic!stórias – Os maiores 
porres da história da humanidade e A maravilhosa sabedoria das coisas.
O poeta Ulisses Tavares declama nu no palco do Sesc Pompéia, em São 
Paulo, nos anos 1980. Imagem em www.revistadacultura.com.br 




15 julho 2013

ACABOU A BRINCADEIRA


Evo viu a uva
e virou o jogo!!!


Quem deve a quem? Evo explica a verdadeira dívida externa


Com linguagem simples, que era transmitida em tradução simultânea a mais de uma centena de Chefes de Estado e dignitários da Comunidade Européia, o Presidente Evo Morales conseguiu inquietar sua audiência quando disse:

"Aqui eu, Evo Morales, vim encontrar aqueles que participam da reunião.

Aqui eu, descendente dos que povoaram a América há quarenta mil anos, vim encontrar os que a encontraram há somente quinhentos anos.

Aqui pois, nos encontramos todos. Sabemos o que somos, e é o bastante. Nunca pretendemos outra coisa.

O irmão aduaneiro europeu me pede papel escrito com visto para poder descobrir aos que me descobriram. 

O irmão usurário europeu me pede o pagamento de uma dívida contraída por Judas, a quem nunca autorizei a vender-me.

O irmão rábula europeu me explica que toda dívida se paga com bens ainda que seja vendendo seres humanos e países inteiros sem pedir-lhes consentimento. Eu os vou descobrindo. 

Também posso reclamar pagamentos e também posso reclamar juros.

Consta no Archivo de Indias, papel sobre papel, recibo sobre recibo e assinatura sobre assinatura, que somente entre os anos 1503 e 1660 chegaram a San Lucas de Barrameda 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata provenientes da América.

Saque? Não acredito! Porque seria pensar que os irmãos cristãos pecaram em seu Sétimo Mandamento.

Expoliação? Guarde-me Tanatzin de que os europeus, como Caim, matam e negam o sangue de seu irmão!

Genocídio? Isso seria dar crédito aos caluniadores, como Bartolomé de las Casas, que qualificam o encontro como de destruição das Indias, ou a radicais como Arturo Uslar Pietri, que afirma que o avanço do capitalismo e da atual civilização europeia se deve à inundação de metais preciosos!

Não! Esses 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata devem ser considerados como o primeiro de muitos outros empréstimos amigáveis da América, destinado ao desenvolvimento da Europa. 

O contrário seria presumir a existência de crimes de guerra, o que daria direito não só de exigir a devolução imediata destes valores, mas também uma indenização pelas destruições e prejuízos. Não.

Eu, Evo Morales, prefiro pensar na menos ofensiva destas hipóteses: tão fabulosa exportação de capitais não foi mais do que o início de um plano 'Marshall-Tezuma’ para garantir a reconstrução da bárbara Europa, arruinada por suas deploráveis guerras contra os cultos muçulmanos, criadores da álgebra, da poligamia, do banho cotidiano e de outras conquistas da civilização.

Por isso, ao celebrar o Quinto Centenário do Empréstimo, poderemos perguntar-nos: os irmãos europeus fizeram uso racional, responsável ou pelo menos produtivo dos fundos tão generosamente adiantados pelo Fundo Indoamericano Internacional?

Lastimamos dizer que não. Estrategicamente, o dilapidaram nas batalhas de Lepanto, em armadas invencíveis, em terceiros reichs e outras formas de extermínio mútuo, sem outro destino que terminar ocupados pelas tropas gringas da OTAN, como no Panamá, mas sem canal.

Financeiramente, têm sido incapazes, depois de uma moratória de 500 anos, tanto de cancelar o capital e seus fundos, quanto de tornarem-se independentes das rendas líquidas, das matérias-primas e da energia barata que lhes exporta e provê todo o Terceiro Mundo.

Este deplorável quadro corrobora a afirmação de Milton Friedman, segundo a qual uma economia subsidiada jamais pode funcionar e nos obriga a reclamar-lhes, para o seu próprio bem, o pagamento do capital e dos juros que, tão generosamente, temos demorado todos estes séculos em cobrar.

Ao dizer isto, esclarecemos que não nos rebaixaremos a cobrar de nossos irmãos europeus as vis e sanguinárias taxas de 20 e até 30 por cento de juros, que os irmãos europeus cobram dos povos do Terceiro Mundo. Nos limitaremos a exigir a devolução dos metais preciosos adiantados, mais o módico de juros fixo de 10 por cento, acumulado somente durante os últimos 300 anos, com 200 anos de graça.

Sobre esta base, e aplicando a fórmula europeia de juros compostos, informamos aos descobridores que nos devem, como primeiro pagamento de sua dívida, uma massa de 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata, ambos estes valores elevados à potência de 300. Isto é, um número para cuja expressão total seriam necessários mais de 300 algarismos, e que supera amplamente o peso total do planeta Terra.

Muito pesados são esses blocos de ouro e prata. Quanto pesariam, calculados em sangue?

Alegar que a Europa, em meio milênio, não pôde gerar riquezas suficientes para cancelar esse módico juro, seria tanto como admitir seu absoluto fracasso financeiro e/ou a demencial irracionalidade das bases do capitalismo.

Tais questões metafísicas, desde logo, não inquietam os indoamericanos. Mas exigimos, sim, a assinatura de uma Carta de Intenção que discipline os povos devedores do Velho Continente, e que os obrigue a cumprir os seus compromissos mediante uma privatização ou reconversão da Europa, que permita que se nos entreguem-na inteira, como primeiro pagamento desta dívida histórica..."

*Exposição do Presidente da Bolívia Evo Morales ante reunião de Chefes de Estado da Comunidade Europeia

(conteúdo publicado em http://cms.onic.org.co)